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sábado, 28 de junho de 2008

O caso Isabella e a presunção de inocência


Há cerca de um mês não se fala de outro assunto na mídia, que não seja o “caso Isabella”.
A brutal morte daquela criança tornou-se o caso policial mais polêmico dos últimos tempos e tem possibilitado às emissoras de TV elevados índices de audiência, mesmo quando o teor das matérias é pouco informativo, ou meramente sensacionalista.
Certo é que a complexidade do crime, da qual decorreu uma visível dificuldade da polícia em concluir a elucidação do ocorrido, aliada à demora na conclusão do inquérito policial, têm convertido a cobertura da tragédia numa novela a que todos somos obrigados a assistir, nas nossas noites, no aconchego de nossos lares.
Mas não desejamos penalizar o nobre leitor, já fatigado com a abordagem exagerada e sensacionalista que se tem dado ao caso, com mais um artigo que muito fala, e pouco explica.
Convidamo-lo, antes, a refletir sobre a árdua tarefa de julgar.
Certa vez li, nas primeiras páginas de uma obra de Processo Penal, uma citação, que dizia algo assim: “ que homem é suficientemente Deus para julgar outro homem? ” . Penitencio-me perante o leitor por não poder citar o nome do autor da frase, mas isso não lhe retira o conteúdo sábio e mordaz.
Acompanhando o posicionamento da grande mídia, e mesmo o da maioria dos cidadãos comuns, entre os quais eu me incluo, percebo que muitos têm se julgado “deuses” o suficiente, para julgar e condenar.
A opinião pública já indiciou, denunciou, processou e condenou, sumariamente, o casal Alexandre Nardoni e Ana Carolina Jatobá, pela morte da pequena Isabella. Algumas pessoas já discutem a pena a ser aplicada: uns até dizem “trinta anos será pouco, deveriam mudar a lei”.
Não desejo aqui fazer defesa do casal, mesmo porque é temerário a um causídico opinar acerca de um caso sem saber exatamente o que foi apurado, sem “compulsar os autos”, como se diz tecnicamente, mas vejo-me na obrigação de defender a presunção de inocência, prevista inclusive em nossa Constituição Federal.
Nossa Carta Política de 1.988, em seu artigo 5º, inciso LXII prevê, numa linguagem até aos leigos acessível, que: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Portanto, mesmo após uma eventual condenação perante o tribunal do júri, Alexandre e Ana Carolina deverão ser tratados como inocentes, se pendente algum recurso da defesa.
A norma está inserida no texto constitucional, entre os direitos e garantias dos acusados, durante o processo penal, e visa, pelo menos em tese, proteger o indiciado ou acusado da execração pública a que os suspeitos podem estar sujeitos, durante o trâmite de um processo.
Pois, pelo que se tem visto, com relação ao casal Nardoni, a presunção de inocência deu lugar a uma certeza de culpa, fomentada por importantes e relevantes setores da imprensa.
Ainda que os indícios sejam fortes, não se pode presumir a culpa, sem o transcurso de um processo penal, o qual sequer foi iniciado.
Opinar sobre alguma situação é direito de todos, entretanto, não é justo condenar sumariamente quem quer que seja.
Escrito em abril de 2008.

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