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segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Política e Olimpíadas


Política e olimpíadas sempre estiveram muito mais próximas do que se pode imaginar.

Quem não se recorda da história do grande velocista Jesse Owens, o espetacular atleta americano, calando Hitler e jogando por terra sua pseudo-teoria da superioridade da raça ariana, nos jogos de Berlim, em 1936. Assistir pessoalmente àquele negro vencendo com sobras seus adversários pelo menos deveria ter servido ao Führer rever seus ideais político-ideológicos.

Lado outro, mais recentemente, ainda sob o manto da Guerra Fria, a instável relação política x olimpíadas prestou grande desserviço ao esporte, quando EUA e URSS, maiores potências olímpicas da época, boicotaram os jogos de Moscou – 1980 e Los Angeles – 1984, respectivamente, empobrecendo em muito os dois eventos.

Pois chegamos a Pequim – 2008, e uma vez mais política e jogos olímpicos estão a caminhar juntos, pena que, pelo que se depreende da maneira como a China tem se portado perante assuntos polêmicos tais como Tibete e liberdade de opinião, a política austera tem emudecido os gritos de liberdade, dando um certo ar de hipocrisia os jogos.

A concessão à China, da cortesia de realizar os jogos olímpicos, a maior confraternização esportiva do planeta, tinha por objetivo fundamental “amolecer”, ou pelo menos “humanizar” o severo regime político chinês, onde direitos humanos e liberdades políticas inexistem, e onde as pessoas ainda não ascenderam ao status de sujeitos de direitos políticos.

Pois passados sete anos da confirmação de que a nação chinesa realizaria os jogos o que se pode compreender, agora, às vésperas da abertura oficial, é que o alentado espírito olímpico, ao que parece, em nada tem servido para tornar mais flexível o regime político chinês e, ao contrário, o que se tem visto é um verdadeiro estado policial, onde a simples manifestação, ainda que verbal, de opinião contrária ao regime comunista e aos seus métodos, pode resultar em graves conseqüências ao “infrator”.

A opressão é tamanha que mesmo a censura ao acesso de jornalistas à Internet, que o governo chinês havia concordado em suprimir, ainda não está totalmente descartada, tendo o Comitê Olímpico Internacional de praticamente barganhar o direito de que a imprensa possa acessar à Internet, livremente.

É óbvio que ninguém esperava que os Jogos pudessem transformar a China Comunista numa nação democrática, mas não seria descabido prever que os princípios básicos do esporte tais como igualdade, liberdade, fraternidade e justiça pudessem tornar a China, já moderna em termos tecnológicos e econômicos, um pouco mais moderna também em assuntos políticos.

É razoável admitir-se que a China pós-Pequim 2008 não perderá em nada, em termos de radicalismo político, para o regime pré-jogos.

O espírito olímpico pode nos proporcionar imagens belas, a serem eternamente lembradas, mas talvez ainda não seja forte o suficiente para tocar no coração dos membros do poderoso Partido Comunista chinês.


Publicado na edição do Jornal Correio, de 11.08.2008, edição n.21.304, ano 70, Uberlândia/Mg.