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terça-feira, 28 de maio de 2013

As verdades de Barbosa

O Supremo Tribunal Federal, antes de ser um órgão jurisdicional, é claramente um órgão político, entendendo-se o vocábulo político não com o sentido pejorativo com o qual é adotado, mas sim com o sentido de político enquanto órgão dotado de relevantes competências no âmbito do estados e cujas decisões devem se ponderar acerca do impacto na vida social, política e econômica do país.

Compreendida a natureza autenticamente política do STF, não é de se estranhar o comportamento igualmente político dos seus ministros e aqui mais uma vez não se esta a criticar este proceder eis que tato e diplomacia são vitais ao bom relacionamento dos poderes constituídos.

Pois o grande Joaquim Barbosa, este ministro alçado ao posto de pop star do Judiciário pátrio durante o interminável julgamento do Mensalão, veio a por abaixo esta diplomacia que sempre acompanha os presidentes do STF quando de suas manifestações.

Barbosa não titubeia em emitir opinião sobre qualquer fato de relevo, ainda que desagrade a muitos seu modo de pensar. O que mais me chama a atenção na conduta de Barbosa não é a ausência de papas na língua, ou a absoluta independência para opinar. O que mais me atordoa nisto tudo é que Barbosa está falando quase sempre verdades dolorosas.

Muitos criticaram recentemente a alcunha de “partidos de mentirinha” com a qual se referiu aos partidos políticos brasileiros. Mas observando a flexível ideologia dos partidos, os quais têm sido utilizados apenas como massa de manobra para obtenção e manutenção do poder, verificamos que verdade alguma há na existência e na atuação dos mesmos. Como bem frisado por Barbosa, são “ de mentirinha”.

Recentemente, em uma exposição na Costa Rica, Barbosa criticou a imprensa brasileira, na qual não se verificaria diversidade ideológica e uma clara tendência das ideias à direita. Mais uma vez, digna de aplausos são as considerações, e verdades, emanadas do ministro falastrão.

Em abril, ao comentar a criação de tribunais regionais federais, Barbosa criticou o trâmite “sorrateiro” da PEC que resultou na criação dos novos tribunais, vez que sequer o STF foi informado da fase da tramitação da mesma. uma vez mais, Barbosa fala o que muitos gostariam de dizer.

Citamos apenas estas três recentes situações, mas o histórico de falas polêmicas e verdades ditas cruamente pelo ministro já é longo.

Pode-se criticar os modos, ou a falta de modos, do Ministro Joaquim Barbosa, mas sua franqueza por vezes dolorosa serve para superar um pouco da hipocrisia com que no Brasil se tende a tratar diversos temas de importância. Nos dois anos em que ficará à frente do tribunal máximo da nação é de se esperar que temas de relevo passem pelo crivo, crítico, sincero, ácido e independente, do Dr. Barbosa.

Publicado na edição de 30.05.2013 do Jornal da Manhã, de Uberaba/MG.

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Direitos trabalhistas em um ambiente de crise econômica global: a necessidade do intervencionismo estatal e a desnecessidade de tolhimento de direitos

Em 2008 o mundo capitalista foi estremecido por uma das maiores crises de sua história a qual, embora iniciada nos EUA, repercutiu em praticamente todas as nações, promovendo recessões, desemprego, falências e diversas outras repercussões negativas. 

Pois a crise que assombrou o mundo em 2008 voltou a provocar danos a partir do ano de 2011, sobretudo nas nações europeias, levando países como Grécia, Espanha e Portugal à beira do colapso e colocando em risco a própria existência do euro, a moeda que hoje utilizam as economias mais influentes daquele continente, excepcionado o Reino Unido. 

Num ambiente de crise econômica severa sempre há ensejo para debates acerca da suspensão, redução ou cancelamento dos direitos laborais, como medida para desonerar as empresas já supostamente penalizadas pelos efeitos da crise. 

Na Grécia, que seguramente foi a nação mais atingida pelos efeitos da crise, como medida que lhe foi imposta para obtenção de recursos externos para salvar sua economia teve de reduzir drasticamente os salários, flexibilizar as leis trabalhistas propiciando milhares de demissões e cortar pensões, atingindo milhões de trabalhadores gregos nos seus mais básicos direitos. Conforme adiante explanaremos, as medidas restritivas dos direitos trabalhistas são fruto do recorrente oportunismo propiciado pela crise, e são falaciosamente legitimadas como medidas necessárias e impostergáveis para o enfrentamento da crise, quando em verdade somente servem ao benefício do empresariado, dos grandes capitalistas. 

Conquanto a questão ora em apreço possa e deva ser apreciada pelos juristas, dada sua repercussão na seara dos direito laboral, econômico, financeiro, tributário e outros recantos da ciência jurídica, a verdade é que o tema em tela tem um aspecto muito mais político e econômico, do que propriamente jurídico, na medida em que as crises econômicas e suas consequências decorrem precipuamente da opção das nações mais influentes do sistema capitalista por um modelo neoliberal, caracterizado sobretudo por uma ausência de uma firme regulação estatal do sistema financeiro e por um propalado (e ultrapassado) não intervencionismo estatal na economia, que só tem beneficiado a quem deseja obter lucros vultosos no sistema capitalista. 

As políticas econômicas neoliberais que têm orientado as ações dos governos nas últimas três décadas, e que tiveram como uma de suas expoentes a recentemente falecida ex-primeira ministra britânica Margareth Thatcher, têm levado a uma ausência da regulação do mercado financeiro, abrindo campo para a livre e deletéria especulação financeira a qual, de tempos em tempos, gera crises catastróficas no sistema capitalista, as quais têm atingido justamente quem não tem responsabilidade ou culpa alguma nesta crise, qual seja a classe trabalhadora, os pensionistas, os aposentados e os mais pobres. 

O enfrentamento das crises passa pela necessária regulação do mercado financeiro, mediante a taxação pesada dos lucros dos especuladores e mesmo uma fiscalização das ações nos mercados de capitais, e deve ser complementada com a desoneração tributária temporária dos empregadores, posto ser preferível o governo renunciar a tributos a termos uma legião de desempregados que, nesta condição, não poderiam contribuir com o reaquecimento da economia, eis que privados de seus salários e consequentemente afastados do mercado de consumo. A isso se somariam os gastos públicos e as medidas assistencialistas, mesmo em um ambiente de crise, porque assim agindo se assegurariam meios de a economia naturalmente se reaquecer, recobrando o fôlego e gradualmente extirpando os efeitos da crise. 

A manutenção dos empregos, dos salários nos patamares pré-crise e mesmo a integral manutenção de todos os demais direitos de natureza trabalhista é medida que se impõe não apenas sob o aspecto humanitário da questão, o qual por si só justificaria o respeito aos mesmos, mas ainda que se analise a questão por um viés puramente econômico é adequado se imaginar que em nações em crise, e em estado de recessão, o aquecimento da economia decorre, em grande medida, do fluxo de recursos, contribuindo para tanto o consumo que somente pode ser assegurado se um razoável contingente da população economicamente ativa estiver trabalhando e podendo efetuar gastos regularmente. 

As ideias acima expostas nada mais são do que a exposição das revolucionárias teses do maior economista do século XX, o grande John Maynard Keynes que se opunha frontalmente aos adeptos do liberalismo econômico, que preconizavam a necessidade de se evitar intervenções e regulações dos mercados, os quais adquiririam a esperada estabilidade naturalmente. Para o economista britânico, para enfrentar crises e recessões, necessário seria que os governos injetassem o máximo de recursos na economia, possibilitando assim o seu reaquecimento e gradual recuperação. 

As medidas restritivas e de arrocho, segundo as ideias keynesianas, além de não promover a melhora do quadro poderiam agravá-lo. Seria algo como reduzir o oxigênio de um paciente que está na UTI. 

O intervencionismo estatal, segundo Keynes, seria legítimo não apenas para regular os mercados, mas mesmo para assegurar a saúde financeira das empresas, bastando lembrarmo-nos do setor automobilístico americano, que recebeu bilhões daquele governo quando da crise de 2008. Não houvessem sido feitas aquelas intervenções teríamos as maiores montadoras americanas quebradas e milhares de funcionários demitidos, agravando a crise. Hoje elas estão financeiramente saudáveis, os empregos foram assegurados, carros são produzidos, vendidos, e impostos são gerados, tudo num contexto de crise em que não foram necessários tolhimentos de direitos dos trabalhadores. 

Mesmo no Brasil, cujos efeitos da crise, ainda que menores, se fazem sentir desde 2008, a redução de impostos do setor automobilístico assegurou a manutenção de empregos de milhares de trabalhadores, e nas consequências econômicas positivas deste quadro. 

O argumento da crise não há de valer para se tolher direitos laborais, na medida em que as restrições destes direitos poderiam até mesmo agravar o quadro de crise, dados os reflexos inevitáveis na redução do consumo, na arrecadação de tributos etc. As restrições de direitos trabalhistas em tempos de crise são medidas errôneas, ineficazes e oportunistas, porque ignoram a condição humana dos trabalhadores, impondo-lhes os ônus de um momento histórico para o qual não contribuíram, e talvez no qual estejam entre as principais vítimas. 

As crises financeiras têm culpados bem conhecidos, e dentre os mesmos não estão os trabalhadores, cujos direitos hão de ser assegurados, a qualquer custo, ainda que para tanto tenha o estado de intervir. Restringir direitos trabalhistas é medida oportunista que não se justifica e não se sustenta, por desrespeitar a dignidade dos trabalhadores e por agir no sentido contrário ao verdadeiro enfrentamento da crise econômica.

terça-feira, 21 de maio de 2013

Servidor municipal de Uberlândia: uma eterna espera por reconhecimento

Na apresentação do projeto da LDO para o exercício financeiro de 2014 o prefeito municipal enfatizou que o foco do projeto é a valorização dos servidores públicos, mediante a concessão de benefícios à classe e mediante a adoção de medidas concretas com vistas à recomposição salarial dos vencimentos daqueles. O prefeito ainda assumiu o compromisso de apresentar um novo plano de cargos e carreiras para o funcionalismo municipal.

A administração anterior, conquanto tenha dado aumentos aos servidores em todos os anos dos dois mandatos, pouquíssimo caminhou no sentido da autêntica recomposição salarial, na medida em que decotados dos reajustes anuais a inflação, teríamos recomposições anuais pífias, na casa dos 2 a 3%. Igualmente nada inovou a administração anterior em termos de plano de cargos e carreiras, tanto que manteve praticamente inalterado, durante os oito anos, o plano aprovado no último ano do Governo Zaire. A única mudança de impacto implementada na administração anterior foi a majoração da jornada dos servidores do Dmae de 6 para 8 horas/dia.

Uma política salarial que almeje viabilizar uma recomposição dos vencimentos dos servidores há de ser agressiva e não apenas conceder aumentos que se aproximam daqueles dados pelo governo federal ao salário mínimo, os quais basicamente recompõe a inflação. Se em Uberlândia os prefeitos reajustassem os vencimentos dos servidores públicos nos percentuais dos aumentos da arrecadação anual hoje teríamos seguramente uma situação mais digna para os servidores municipais.

Em Uberlândia vivenciamos situações incompreensíveis, como um vereador auferindo mensalmente oito vezes o que um servidor de nível superior ganha em início de carreira, ou um assessor jurídico (cargo em comissão) ganhando três vezes o que um procurador que se submeteu a concurso público recebe mensalmente. Em Uberlândia os vencimentos que percebem os servidores públicos de nível superior são os mais baixos se considerarmos as cidades de população similar à nossa. Mesmo com um doutorado no currículo um servidor municipal de nível superior não recebe o que inúmeros servidores federais de cargo de nível médio auferem ao final de um mês.

Historicamente os servidores públicos sempre foram esquecidos, esta é a verdade, e espera-se que a nova administração promova melhorias efetivas para esta categoria. Certo é que anos a fio de esquecimento e defasagem salarial não serão corrigidos em um curto período, porém uma política salarial séria possibilitaria a valorização contínua da categoria.

Uma administração pública de qualidade demanda uma efetiva e contínua valorização dos servidores públicos, possibilitando-os vencimentos condignos com a responsabilidade e qualidade dos serviços que prestam, bem como vantagens efetivas para progressão nas carreiras, mecanismos de qualificação contínua dentre outros benefícios.

Muito embora seja comum autoridades assumirem compromissos junto ao funcionalismo e após não cumprirem com o prometido, dado o seu aparente comprometimento com a categoria entendo devamos tributar crédito ao prefeito que recentemente assumiu a administração de nossa cidade e aguardar, para um futuro breve, o início da concretização do seu ousado projeto de valorização do servidor público municipal.

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Liberdade de imprensa?

A liberdade de imprensa e de pensamento são marcas de nações democráticas e evoluídas. Para se aferir o grau de progresso e maturidade política de um país basta ver se existe a liberdade de pensamento e de imprensa e, mais do que isso, se ela pode ser efetivamente exercida, sem represálias, sem restrições descabidas, sem temores. Em nações autoritárias como China, Coreia do Norte e Irã a manifestação de opinião contrária ao regime pode trazer consequências desagradáveis ao “infrator”, ao passo que na França e nos EUA o direito de pensar livremente e de expressar e divulgar a opinião são exercidos quase que de forma plena, mesmo porque inexistem obviamente direitos absolutos. 

O Brasil está próximo de complexar três décadas de redemocratização e em outubro nossa Constituição, que assegurou a liberdade de pensamento e de imprensa, completa um quarto de século de vigência. 

Neste novo e democrático Brasil, nascido em 1988 com a nova Constituição, as liberdades de pensamento e de imprensa têm status de direito fundamental, asseguradas que são em seu art. 5º, IV e IX. 

Porém, num país de democracia ainda em construção, e onde há poucas décadas era comum se levar aos quarteis e às delegacias quem ousava expressar o que pensava, ainda são recorrentes obstáculos ao exercício regular deste direito básico. 

Em termos eminentemente jurídicos, verifica-se que não raro juízes tem interpretado restritivamente a Constituição, dando ensejo a situações de verdadeira censura prévia mediante, por exemplo, o impedimento de publicação de obras ou de artigos, ou veiculação de determinada matéria jornalística, não obstante a lei de imprensa ter sido declarada não recepcionada pela CF/88 e a censura prévia restado vedada, eis que incompatível com a Constituição. 

Lado outro, infelizmente o Brasil é uma das nações com maiores índices de atentados contra jornalistas. Os ataques têm ocorrido em diversas cidades do país e normalmente são decorrentes de denúncias e investigações bem conduzidas por membros da imprensa escrita, televisiva ou virtual. Somente no ano de 2012 quatro jornalistas foram mortos e recentemente dois outros foram assassinados na região mineira do Vale do Aço, o que demonstra que um trabalho investigativo pode acabar tragicamente para o profissional da imprensa. 

Por fim, um dos grandes entraves ao desenvolvimento da liberdade de manifestação do pensamento é o verdadeiro oligopólio da informação que atualmente se identifica no Brasil, onde pouquíssimos, e às vezes tendenciosos, grupos são detentores da quase totalidade dos grandes meios de comunicação, das emissoras de TV aos grandes jornais e aos megaportais de informações da Internet. Os blogs, estes mecanismos de divulgação de informações e opiniões que surgiram na última década e que tem se popularizado dentre os usuários da Internet podem ser um meio de se confrontar o oligopólio da informação, na medida em que franqueia a livre disseminação do pensamento e das opiniões. 

Falar sobre liberdade de pensamento e de imprensa no Brasil soa um tanto quanto falacioso, na medida em que são persistentes os entraves ao exercício destes direitos. Liberdade de pensamento e de imprensa são, verdade se diga, direitos que ainda têm muito a evoluir em nosso país.

Publicado na edição de 11.06.2013 do Observatório da Imprensa e na edição de 17.06.2013 do Jornal Correio de Uberlândia/MG.