Páginas

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Orçamento participativo


Reza o parágrafo único do art. 1º de nossa Constituição Federal de 1988 que todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos da Constituição.

Na Grécia antiga vigorava um sistema de exercício do poder onde os cidadãos livres acorriam a reuniões públicas, nas quais todos opinavam e onde se discutiam os temas de relevo para a cidade (pólis). Ocorre que este modelo de debate dos assuntos de interesse comum encontra diversas limitações. Enquanto na pólis grega os cidadãos livres poderiam se reunir numa praça (ágora), numa cidade populosa por certo não seria possível reunir dezenas de milhares de pessoas e deliberar civilizadamente sobre temas de relevo. Para fazer frente a estas limitações, sem retirar o poder do povo, foi desenvolvida a chamada democracia representativa, na qual há a outorga, pelo cidadão eleitor, do poder a um representante, para exercer o poder político que efetivamente pertence àquele.


O orçamento participativo poderia ser considerado um resquício daquele modelo grego de exercício do poder político onde os munícipes apontam seus reclamos e o administrador público lhes ouve e, na medida do possível, atende aos pleitos recebidos.

Conquanto não deixe de ser um modo democrático de o administrador tratar do sempre polêmico orçamento, não são poucas as limitações do chamado orçamento participativo.

Primeiramente, é preciso ponderar até que ponto as discussões realizadas traduzem com fidelidade os pleitos do povo. A nosso sentir, não se pode afirmar de modo seguro que, ao fim dos debates relativos ao orçamento, exista uma vontade popular definida a ser atendida na peça orçamentária.

Os debates do orçamento encontram limitações na amplitude do contingente do povo que deles participam. Para traduzir uma vontade popular mais qualificada as audiências deveriam, no mínimo, ocorrer em todos os bairros e mais de uma vez em cada bairro, num debate permanente e não ocasional.

Lado outro, ainda que as manifestações nas audiências traduzissem a vontade popular, por limitações financeiras o prefeito não poderia atender a todos os pleitos e, numa decisão eminentemente política, deverá escolher o que será encampado no orçamento e o que ficará fora. 

Conquanto possa ser útil abrir-se o orçamento para o diálogo, entendemos que a sua conformação final há de ser baseada no programa de governo apresentado pelo administrador eleito. O eleitor consciente conhece o programa de governo de seu candidato e espera o cumprimento do prometido e a concretização dos projetos passa pela adequada distribuição dos recursos conforme delineado idealmente na peça orçamentária.

O orçamento participativo tem o seu valor e expressa, sobretudo um respeito do administrador pelo povo, entretanto é preciso estar ciente de suas limitações e de que, ao final, orçamento será necessariamente uma peça redigida por técnicos que, manejando parcos recursos, tentarão suprir as necessidades públicas básicas.

Buscando o administrador, ao elaborar o orçamento, atender suas propostas de época de campanha já será uma boa providência, mesmo porque os recursos públicos sempre deverão ser dispostos de modo a se viabilizar a estrita e aguardada consecução de seu programa de governo.

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Governo da periferia


Em uma entrevista concedida recentemente o nosso prefeito mencionou que a prioridade de seu governo é a periferia. As palavras do líder do executivo local são bem ilustrativas do perfil que a administração municipal tenciona adotar na gestão 2013-2016 e, se concretizada, indicam uma evolução sensível e digna de aplausos do modo como deve ser tratada a população uberlandense, sobretudo a mais carente, em seus anseios mais básicos.

Uberlândia é hoje uma cidade com quase seiscentos e cinquenta mil habitantes, os quais não habitam apenas a zona sul ou vivem às margens de nossa bela Rondon Pacheco, mas antes se distribuem em áreas longínquas onde ainda faltam equipamentos públicos básicos como asfaltamento ou mesmo onde os serviços públicos, ainda que existentes, são prestados de forma precária.

Governar com foco na periferia é direcionar a atenção do poder público e as ações da administração local a um enorme contingente de pessoas um tanto quando esquecidas, as quais normalmente somente são lembradas em época eleitoral.

Construir viadutos majestosos pode trazer benefícios para a cidade, mas enquanto ainda carecer a periferia de serviços adequados de saúde e de educação, entendemos que as obras públicas grandiosas podem esperar um pouco. Melhorar o trânsito enquanto a saúde vai mal e faltam vagas em escolas soa inaceitável.

O progresso econômico esplendoroso que Uberlândia vivencia há anos traz a falsa ilusão de que está tudo perfeito em nossa cidade, porém um passeio pela periferia demonstra que a riqueza que circula em nosso município não é por todos usufruída e que há muito a ser feito, cabendo à administração pública a função precípua de dar voz e vez àquelas pessoas historicamente esquecidas pelo poder público, provendo-lhes dos serviços públicos essenciais e possibilitando-lhes uma existência mais digna.

Nossa cidade vive um momento político sem paralelos em sua história. O prefeito habitou a periferia e sabe dos diversos reclamos desta. Ter na administração da cidade uma pessoa que vivenciou os problemas que acometem os moradores das áreas periféricas é uma grande vantagem.

A revisão da tabela do IPTU, por exemplo, embora impopular e resistida até por políticos da base do governo, pode ser uma medida de autêntica justiça social, especialmente se penalizar e reprimir a deletéria especulação imobiliária que sempre existiu em Uberlândia e que governo municipal algum teve vontade, ou coragem, de enfrentar. Tributar exemplarmente os proprietários de terrenos vagos e localizados em áreas nobres e investir estes recursos nas regiões periféricas seria uma medida muito apropriada para um governo que deseja priorizar a condição de vida dos moradores das regiões mais afastadas.

Porém, mudar o foco para a periferia não será tarefa fácil e o prefeito encontrará muita oposição nesta empreitada. Governar com foco na periferia pode desagradar a classes sempre privilegiadas no município e isto pode resultar em dificuldades ao governo municipal.

O foco na periferia atrai para o prefeito diversas e complexas responsabilidades com uma parcela significativa de seu eleitorado. Aguardemos atentamente o transcorrer de sua administração para ver a concretização, ou não, deste projeto!

Publicado na edição de 20.09.2013 do Jornal Correio de Uberlândia.