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segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

O perdão imerecido

Provocaram perplexidade e revolta as imagens divulgadas por uma grande emissora de TV, do Governador do Distrito Federal José Roberto Arruda recebendo volumosas quantias de dinheiro.

A ausência, até a presente data, de uma justificativa aceitável para o recebimento de tamanha monta de dinheiro, mesmo depois de semanas de divulgação das imagens, não deixam dúvida de se tratar de mais um caso de deslavada corrupção.

Observando o passado político de Arruda percebemos que esta não é a primeira vez que seu nome ganha a mídia envolvido num caso de condutas imorais.

Em 2001 o então Senador Arruda envolveu-se em um outro caso de afronta ao decoro parlamentar quanto, em conjunto com o falecido senador ACM, devassou os dados do painel do Senado Federal, conseguindo obter preciosas informações sobre a polêmica votação que resultou na cassação do então senador Luis Estevão.

Pois bem, após ter negado veementemente a participação dos fatos, o senador Arruda, percebendo que o cerco se fechava e que cedo ou tarde a verdade viria à tona e sua cassação seria certa, acabou por renunciar ao seu cargo para preservar seus direitos políticos.

Seria aquele reprovável episódio de 2001 o fim da carreira política do Sr. Arruda? Infelizmente, a memória do eleitorado é curta e a tolerância com a falta de caráter é imensa, de forma que em 2002 e em 2006, ao candidatar-se ao cargo de deputado distrital e governador do DF, respectivamente, o Sr. Arruda recebeu um perdão a nosso ver imerecido, e voltou a deter o poder político.

Tratamos do caso Arruda, pois é o que está em debate no momento, porém poderíamos citar dezenas de outros casos de políticos que tiveram de renunciar para não serem julgados por atos reprováveis e acabaram por voltar ao poder nos braços de um eleitorado tolerante e passivo.

Em países como EUA, Inglaterra e Japão um ato falho de um político, por mais insignificante que possa parecer, fulmina em definitivo sua carreira política. No Brasil, infelizmente, parece não haver ato de corrupção que o tempo não possa apagar.

Publicado no Jornal "Correio de Uberlândia", de 23.12.2009.

domingo, 6 de dezembro de 2009

Quem manda mais?


A teoria da separação de poderes do Estado foi desenvolvida e sistematizada no século XVIII por um teórico e pensador francês conhecido como Montesquieu.

Em sua obra prima “Do Espírito das Leis” o grande filósofo propunha algo bem simples. Basicamente, defendia que o poder não pode ser centralizado em uma pessoa, ou órgão, mas deve ser distribuído, para o bom gerenciamento do estado, e para evitar-se o autoritarismo. Assim foram concebidos os rudimentos daquilo que hoje conhecemos como os três poderes, a saber: Executivo, Legislativo e Judiciário.

Não existe hierarquia entre os poderes, mas sim uma coordenação harmônica e disciplinada em um texto constitucional, onde a atividade de um poder é limitada pela de outro. Um poder não se sobrepõe ao outro, pelo bem do estado de direito e da democracia.

Pois esta regra política da divisão de poderes, já tão antiga e de inquestionável utilidade, tem causado fortes embates entre autoridades e instituições políticas brasileiras.

Recentemente, o presidente Lula (líder máximo do Executivo) esbravejou, a meu ver sem razão, contra a atuação rigorosa do TCU (órgão do Legislativo), o qual estaria travando o bom desempenho do Programa de Aceleração do Crescimento. Cogitou-se até a criação de um órgão federal cujos poderes se sobrepusessem aos do TCU. Nada mais absurdo e inconstitucional.

Outro caso de repercussão mundial e que expõe a divergência entre os poderes estatais é relativo à extradição do italiano Cesare Battisti. Embora o Executivo, através do Ministro da Justiça Tarso Genro, tenha reconhecido a condição de refugiado político do ativista italiano, caberá ao Supremo deliberar acerca de sua extradição, o que deverá ocorrer nos próximos dias. Se o STF extraditar Battisti seguramente cairão sobre os ministros acusações de estarem a se sobrepor á decisão do Executivo, que concedeu a proteção política ao estrangeiro.

Entretanto, mais grave que as duas situações acima mencionadas e digna de regimes de exceção foi a do não cumprimento imediato, pelo digno Senador José Sarney, da ordem judicial, emanada do STF, que determinava a cassação do mandato do Senador Expedito Jr. Somente após a omissão do senador Sarney ter repercutido negativamente na imprensa foi atendida a ordem do Supremo, porém o estrago institucional estava feito, e por muito pouco o poderoso senador maranhense não teve expedido contra si um mandado de prisão, por descumprimento de ordem judicial.

O estado democrático de direito pressupõe o respeito entre os poderes, sob pena de caminharmos rumo ao autoritarismo. Presidentes e senadores precisam compreender que acima de seus poderes está um poder maior, denominado lei, que sempre há de ser respeitada.


Publicado no Jornal Correio de Uberlândia, em 06.12.2009.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Prática Forense - Artigo citado em acórdão do TJMG


Prezados leitores,

Foi proferido pelo egrégio TJMG acórdão em que há remissão ao artigo de nossa autoria, intitulado "Questões controvertidas acerca da prática forense nos concursos jurídicos", o qual foi publicado na Revista do TRF da Primeira Região, em junho de 2.005, bem como no CD da Revista Júris Síntese.

Segue, abaixo o texto integral do acórdão, com destaque para o trecho onde ocorre a citação.

Recomendamos a leitura do mesmo, bem como a do próprio artigo (http://hugocesaramaral.blogspot.com/2008/06/questes-controvertidas-acerca-da.html), aos candidatos a concurso público que desejarem se interar do debate jurídico acerca da acepção da polêmica expressão "prática forense".

Mui Cordialmente,

Hugo Cesar Amaral

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Número do processo: 1.0000.06.439921-5/000(1), Relator: NILSON REIS, Relator do Acórdão: NILSON REIS, Data do Julgamento: 30/11/2006, Data da Publicação: 02/03/2007.


Inteiro Teor:

EMENTA: Mandado de Segurança. Concurso para carreira do Ministério Público. Três anos de atividade jurídica. Necessidade de regulamentação. Tempo de comissariado de menores indevidamente desconsiderado pela Comissão de Concurso. Estágio como estudante de direito considerado para contagem de tempo de atividade jurídica. Candidata aprovada em todas as fases do concurso. Segurança concedida.
MANDADO DE SEGURANÇA N° 1.0000.06.439921-5/000 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - IMPETRANTE(S): LUANA CIMETTA - AUTORID COATORA: PROCURADOR GERAL JUSTIÇA MINAS GERAIS - RELATOR: EXMO. SR. DES. NILSON REIS
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda o 1º GRUPO DE CÂMARAS CÍVEIS do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, EM CONCEDER A SEGURANÇA, VENCIDOS OS TERCEIRO, QUARTO E SEXTO VOGAIS.
Belo Horizonte, 30 de novembro de 2006.
DES. NILSON REIS - Relator
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01/11/2006
1º GRUPO DE CÂMARAS CÍVEIS
ADIADO
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
MANDADO DE SEGURANÇA Nº 1.0000.06.439921-5/000 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - IMPETRANTE(S): LUANA CIMETTA - AUTORID COATORA: PROCURADOR-GERAL JUSTIÇA MINAS GERAIS - RELATOR: EXMO. SR. DES. NILSON REIS
Proferiu sustentação oral, pela Impetrante, o Dr. Aguinaldo de Oliveira Braga.
O SR. DES. NILSON REIS:
VOTO
Trata-se de Ação de Mandado de Segurança impetrada por Luana Cimetta em face de ato do Excelentíssimo Procurador-Geral de Justiça de Minas Gerais, que indeferiu seu pedido de inscrição definitiva no XLVI Concurso para a Carreira do Ministério Público Estadual (fls.08), fato que a impediria de participar das Provas Orais realizadas no dia 23.06.2006, caso não tivesse obtido liminar para tal, concedida por este Relator.
Consta dos autos, que a impetrante foi aprovada no concurso, naturalmente sub judice (fls.65), mas soube que não seria nomeada, o que a fê-la requerer a este Relator o desdobramento da liminar para que fosse nomeada, empossada e entrasse em exercício, pedido que indeferi nos seguintes termos: "o pedido, em análise, escapa do objeto da impetração, que foi apenas o de participação em provas orais e de tribuna, pelo que o indefiro".
Às fls. 104, foi noticiado que a impetrante obteve em Agravo Regimental nos autos de Mandado de Segurança,
distribuído ao eminente Des. Maciel Pereira, liminar para ser nomeada, empossada e entrar em exercício.
O Procurador-Geral de Justiça prestou informações (fls. 137/150).
Este o relatório. Decido.
A questão central do presente mandamus cinge-se a averiguação do preenchimento ou não pela impetrante do requisito de três anos de atividade jurídica para ingresso na carreira do Ministério Público, segundo o art. 129, § 3º da CR/88, inovação trazida pela Emenda 45/2004:
"O ingresso na carreira do Ministério Público far-se-á mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em sua realização, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e observando-se, nas nomeações, a ordem de classificação".
O que se entende, portanto, por atividade jurídica, que é um termo muito amplo, imprescinde de regulamentação, como adverte Hugo Nigro Mazzilli:
"Além dos casos óbvios dos advogados militantes, dos promotores e juízes em exercício, que, sem dúvida, exercem "atividade jurídica", ainda há outras hipóteses, menos óbvias, porém. O estagiário profissional, assim reconhecido pela OAB, exerce atividade jurídica? Segundo cremos, e já o antecipamos, a resposta deve ser positiva. E o estagiário acadêmico ou do Ministério Público? Por que não também? E o Delegado de Polícia? Estamos certo de que sim. E o Escrivão de Polícia? E o escrevente judiciário ou o Oficial de Promotoria do Ministério Público, por que não? E, mesmo para o advogado militante, quantas peças profissionais por ano consideram-se efetiva prática de atividade jurídica? Só uma boa e sensata regulamentação poderá responder a tudo isso...
Todas essas são questões que supõem regulamentação em âmbito federal, para evitar discrepâncias regionais as quais fariam com que uma exigência nacional fosse interpretada de maneira diferente em cada Estado-Membro, quebrando-se inadmissivelmente a unidade do Direito federal" ("A prática da atividade jurídica nos concursos", site www.jusnavigandi.com.br).
O Conselho Nacional do Ministério Público já regulamentou a atividade jurídica nas Resoluções 04 e 11, como sendo as atividades desempenhadas exclusivamente após a obtenção do grau de bacharel em Direito, não vigentes, ainda, na ocasião da abertura do Edital do concurso em questão.
Constou do Edital do XLVI Concurso para a Carreira do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, item III, letra c:
"São requisitos do candidato ao concurso para ingresso na carreira do Ministério Público: c) possuir, no mínimo, três anos de prática de atividade jurídica, de acordo com os termos previstos no §1º, do artigo 11, do Regulamento do Concurso".
Transcreve-se o art. 11, § 1º do Regulamento:
"Art. 11 - O requerimento da inscrição definitiva dos candidatos aprovados nas provas escritas, conforme prévia publicação no órgão oficial, será instruído com os seguintes documentos, entre outros constantes no edital.
§ 1º - Considera-se atividade jurídica, comprovada por certidão do respectivo órgão:
I - O exercício da advocacia (postulação perante o Poder Judiciário ou o desempenho de atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas, com inscrição na OAB como advogado);
II - O exercício de cargo, emprego ou função pública privativos de bacharel em Direito;
III - O exercício de estágio oficial perante o Ministério Público, o Poder Judiciário ou a Defensoria Pública, ou outra carreira jurídica assemelhada, demonstrando-se, no mínimo, 20 (vinte) horas de dedicação semanal;
IV - Estágio profissional de advocacia, nos termos do art. 9º, inciso II da Lei nº 8.906/94;
V - O exercício dos cargos de técnico em Direito do Ministério Público e de oficial do Ministério Público;
VI - O efetivo exercício de outros cargos, empregos ou funções públicas que, a juízo da comissão de Concurso, exijam conhecimento jurídico, demonstrando-se, detalhadamente, as atribuições exercidas".
Verifica-se, pelo último inciso, na expressão "a juízo da comissão de Concurso", que o § 1º é "numerus apertus", ou seja, tem caráter exemplificativo, não restringindo o que seja atividade jurídica.
Às fls. 177, consta que não foi considerada a atuação da impetrante como Comissária de Menores, pois
"não se enquadra em quaisquer das consideradas como atividades jurídicas previstas no Regulamento do Concurso, e em face das prerrogativas conferidas à comissão de concurso pelo inciso VI do § 1º do art. 11 do mesmo diploma legal, esta não foi considerada para efeitos do preenchimento do referido requisito".
A Comissão de Concurso, permissa venia, não pode desconsiderar este período em que a impetrante foi Comissária de Menores, haja vista que aceitou, como contagem de tempo, estágio ainda como estudante.
Ora, um estudante inscrito na OAB como estagiário e que trabalha como "office boy de luxo" conta tempo de atividade jurídica e uma Comissária de Menores, que vive a prática do Estatuto da Criança e do Adolescente, não pode contar? Não é razoável, data maxima venia.
A impetrante, sendo uma jovem de 23 anos, que se formou em fevereiro deste ano, conseguiu ser aprovada num concurso de Ministério Público, tido como um dos mais difíceis do país e demonstrou os três anos de atividade jurídica, devendo ser considerado o tempo no Comissariado de Menores.
Já decidiu este Tribunal em caso análogo:
"EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA - CONCURSO PARA INGRESSO NA CARREIRA DO MINISTÉRIO PÚBLICO - INSCRIÇÃO - REQUISITOS - DEMONSTRAÇÃO - SEGURANÇA CONCEDIDA. Deve ser concedida a segurança no caso da demonstração pela impetrante do cumprimento dos requisitos exigidos para a inscrição no Concurso para Ingresso na Carreira do Ministério Público, consistentes na comprovação da condição de estagiária na instituição e do exercício de três anos de prática de atividade jurídica (MANDADO DE SEGURANÇA N° 1.0000.05.424400-9/000, RELATORA DES.ª TERESA CRISTINA DA CUNHA PEIXOTO).
Não cabe uma interpretação restritiva, sob pena de ferir-se o princípio da impessoalidade.
Assim sendo, com estes fundamentos, ratifico a liminar e concedo a segurança pleiteada.
Sem custas.
O SR. DES. JARBAS LADEIRA:
Sr. Presidente.
Peço vista dos autos.
O SR. DES. FRANCISCO FIGUEIREDO:
Pela ordem.
Gostaria de antecipar meu voto, concedendo a segurança.
SÚMULA: PEDIU VISTA O DES. JARBAS LADEIRA. CONCEDIAM A SEGURANÇA O RELATOR E O 8º VOGAL EM ADIANTAMENTO DE VOTO.
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NOTAS TAQUIGRÁFICAS
Assistiram ao julgamento, pela Impetrante, os Drs. Aguinaldo de Oliveira Braga e Maria Isabella Rodrigues Gonçalves.
O SR. PRESIDENTE (DES. NILSON REIS ):
O julgamento deste feito foi adiado na Sessão do dia 01/11/06, a pedido do Des. Jarbas Ladeira, após votarem concedendo a segurança o Relator e o 8º Vogal em adiantamento de voto.
Com a palavra o Des. Jarbas Ladeira.
O SR. DES. JARBAS LADEIRA:
VOTO
Trata-se de mandado de segurança, impetrado por Luana Cimetta, candidata ao XLVI Concurso para o cargo de Promotor de Justiça Substituto.
Não tendo sido aceito o tempo de prática forense exigido no edital, a candidata em questão obteve liminar para poder realizar o concurso. Após os exames e a devida aprovação, foi novamente impetrado outro mandado de segurança, onde novamente a Impetrante obteve liminar, para conseguir a nomeação e entrada em exercício, estando atualmente a exercer as funções de Promotora de Justiça.
Como o parecer da douta Procuradoria-Geral de Justiça, subscrito pelo ilustre Procurador, Dr. Alceu José Torres Marques, admite que a exigência de um ano, da colação de grau até a inscrição, não foi o motivo do indeferimento, resta a discussão sobre o tempo de prática forense.
A Impetrante apresentou, como prova de tal prática, o tempo de estagiária do Ministério Público, bem como o de prestação de serviço voluntário como Comissária de Menores e Oficial de Apoio Judiciário, no forum de Uberlândia, sendo que os dois últimos não foram aceitos.
Sobre a conceituação do tempo de prática forense, poderíamos dizer uma coisa, mas, embora não seja eu partidário da chamada "teoria do fato consumado", no presente caso a Impetrante já obteve duas liminares sucessivas, que lhe garantiram a apreciação do tempo de prática forense e, depois, a nomeação e exercício como Promotora, após ser aprovada em 39º lugar, entre 2.600 concursados.
Assim, não mais consulta os interesses da Justiça a relutância quanto à permanência da Impetrante no cargo de Promotora de Justiça, já que concursada e devidamente aprovada, para tanto.
Considere-se, por fim, o acórdão nº 1.0000.05.424400-9/000, em que foi Relatora a Sra. Desembargadora Teresa Cristina da Cunha Peixoto, em caso idêntico, em que foi concedida a segurança.
Diante do exposto, acompanho o ilustre Relator, concedendo a ordem.
O SR. DES. BRANDÃO TEIXEIRA:
Sr. Presidente.
Faço severas reservas à teoria do fato consumado e, tanto quanto possível, escuso-me de adotá-la, entretanto, entendo que, na espécie, o eminente Des. Relator conduziu muito bem o desate da questão posta, trazendo a lume texto das Resoluções 4 e 11 do egrégio Conselho Nacional do Ministério Público que regulamentaram o que haveria de se considerar como atividade jurídica para fins de concurso para ingresso em carreira e, dentro do rol de atividades, vêem-se: estágio profissional de advocacia, exercício de estágio como oficial perante o Ministério Público, o Poder Judiciário ou a Defensoria Pública e outros cargos e empregos ou funções públicas que a juízo da Comissão de Concurso, exigem conhecimento jurídico, demonstrando-se, detalhadamente, as atribuições exercidas.
Então, como fica a juízo do poder discricionário da Comissão abrir o rol e nele inserir outras atividades para as quais é necessário conhecimento jurídico e, como já fui juiz de menores e sei que não é de fácil exercício o cargo de comissário de menor, não se limita ele, como já ouvi, apenas ao exercício olfativo de inspeção em copo de menores, para saber se contém bebida alcoólica ou não, sei, repito, que eles têm nas suas mãos missão delicadíssima de policiar locais de espetáculos públicos, casas noturnas e muitas outras questões que lhe são acometidas pelo juiz de menores, para as quais se exige, além de algum preparo jurídico, tirocínio, prudência e bom senso.
Não creio que o cargo de comissário de menores seja menos honroso do que outros que estão arrolados no art.11 do referido Ato Normativo do egrégio Conselho Nacional do Ministério Público e nem penso, também, que para os outros cargos, ali mencionados, alguns deles, exijam, com habitualidade, e, necessariamente, mais conhecimento jurídico do que se exige de um comissário de menores.
Por essa razão, adiro ao voto do em. Des. Relator para ratificar a liminar e conceder a segurança, data venia de quem possa manifestar entendimento diverso.
O SR. DES. EDUARDO ANDRADE:
Sr. Presidente.
Desde logo, com a mais respeitosa vênia dos votos precedentes, vejo-me na condição de inaugurar a divergência e o faço porque a meu ver, a Impetrante não comprovou validamente os 03 (três) anos de estágio em atividade jurídica, conforme exige o edital e o regulamento interno que, a meu ver, são as leis do concurso.
A atuação da Impetrante, comissária voluntária de menores, não pode, data venia, ser considerada atividade jurídica, como deixa consignado o douto Procurador de Justiça às fls.147, e, ademais disso, a mim me parece que é da maior importância dizer que estaríamos abrindo um precedente extremamente grave nos concursos para o Ministério Público e para o Poder Judiciário.
Assim, data maxima venia dos votos proferidos, com a lucidez de sempre, pelos meus em. Pares, entendo que não é caso de mandado de segurança, porque não há nenhum direito líquido e certo a ser protegido, por isso, denego a ordem.
O SR. DES. GERALDO AUGUSTO:
VOTO
No caso concreto e específico, tem-se que o ponto principal da pretensão da Segurança é a alegação de que não teria sido considerada a atuação e o tempo da Impetrante como Comissária de Menores pela Comissão Examinadora do Concurso para ingresso nos quadros de carreira no Ministério Público do Estado de Minas Gerais, por entender esta comissão que tal não se enquadraria em quaisquer das hipóteses consideradas como atividade jurídica prevista no regulamento do concurso.
Conforme os autos, extrai-se do regulamento do concurso que "considera-se atividade jurídica", dentre outras:
"(...)
II- o exercício de cargo, emprego ou função pública privativos de bacharel em Direito;
III- (...) ou de outra carreira jurídica assemelhada (...);
VI- o efetivo exercício de outros cargos, empregos ou funções públicas que, a juízo da comissão de Concurso, exijam o conhecimento jurídico, demonstrando-se, detalhadamente, as atribuições exercidas."
Ora, à evidência, o cargo/função de comissário de menores não se enquadra em nenhuma dessas hipóteses, porque:
1. Não é privativo de bacharel em Direito;
2. Não se caracteriza como carreira jurídica ou assemelhada;
3. Não se trata de cargo, emprego ou função pública, que exija conhecimento jurídico.
Na verdade, trata-se de função pública que exige, atualmente, apenas conhecimentos equivalentes ao segundo grau e, antes, nem mesmo isso; não possui atribuições e fé pública que o aproximem, sequer, da função do oficial de justiça.
Não fosse por isso, o inciso VI do § 1º do art. 11 do Regulamento do Concurso, arremata e finaliza a questão, dela retirando qualquer controvérsia, quando resguardou que, tratando-se do exercício de outros cargos, empregos ou funções públicas, só poderiam ser consideradas, a juízo da comissão de concurso, e mesmo assim, com o requisito indispensável e específico de que para o seu exercício se tenha a exigência e necessidade de conhecimento jurídico; o que não é o caso, repita-se, do comissário de menores.
Agiu acertada e adequadamente a douta comissão do concurso, representada pelo seu presidente, Procurador-Geral de Justiça, apenas cumprindo as regras da lei do concurso (edital), que por sua vez obedeceu ao respectivo regulamento, como visto.
Com tais razões, embora o merecido respeito ao entendimento contido no voto do eminente Desembargador Relator, não se encontra o lastro do direito líquido e certo, a respaldar a pretensão da Impetrante; e pelo que DENEGA-SE A SEGURANÇA, revogando a liminar anteriormente concedida.
A SRª. DESª. VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE:
Sr. Presidente.
A teoria do fato consumado se aplica, apenas, quando a decisão liminar impede o autor de exercer outro direito, que ficou prejudicado pela liminar deferida, é o clássico exemplo do estudante que pede a transferência para outra faculdade e, obtendo a liminar, quando chega ao final da ação a medida é denegada, ele não tem condições de voltar à faculdade anterior por ter perdido tanto freqüência, quanto provas, ficando prejudicado, portanto, seu direito que teria existido, não fora a liminar concedida.
Não se aplica a referida teoria do fato consumado, portanto, quando o ato pode ser revisto ao final, restituindo o autor ao estado anterior, sem ferir qualquer outro direito porventura anteriormente existente e que teria deixado de ser exercido em face do requerimento preliminar.
Com essas breves considerações, peço licença ao em. Des. Eduardo Andrade para adotar os fundamentos de seu voto, bem como ao Des. Geraldo Augusto e, mormente, para preservar a força do edital antes não impugnado, motivo pelo qual denego a segurança.
O SR. DES. ARMANDO FREIRE:
Sr. Presidente.
Refleti muito a respeito da matéria, de resto, tormentosa e mais ainda agora, nesta oportunidade, estando em minhas mãos a decisão deste julgamento, em que, parece-me, salvo engano, três em. Colegas concedem a ordem e três a denegam. A reflexão a que fui impelido estende-se, pois, seguramente, até este instante.
Preambularmente, gostaria, e peço permissão para fazê-lo, de reportar-me, a propósito do alegado formalismo, e já comentando a respeito de atender ou não certas exigências contidas em editais de concursos, ao voto do Des. Edgard Penna Amorim, quando do julgamento do mandado de segurança nº 1.0000.05.424400-9/000, do 4º Grupo de Câmaras Cíveis deste TJMG. Naquela oportunidade, S. Exª. fez constar do seu voto o seguinte: "Acompanho a em. Relatora e, também, concedo a ordem, não sem antes reservar-me o oportuno e eventual aprofundamento do exame da matéria, sobretudo, à luz da legislação superveniente, bem como de fazer respeitosa ressalva quanto à assertiva de que exigências editalícias, respaldadas em lei, poderiam ser tomadas por consubstanciadoras de exacerbado formalismo, pois, na medida em que se trata de normas regentes de certame público, a formalidade é de rigor, sob pena de desprestígio do princípio da isonomia".
A r. manifestação, que me parece encampada no voto do em. Des. Eduardo Andrade, pontifica que se deve respeitar as normas do edital e que o concurso seja levado a termo de acordo com o que ali se vê estabelecido.
Feito esse registro, Sr. Presidente, permito-me, ainda, acrescentar, que não me parece, com a vênia devida, esteja o julgamento jungido à questão da teoria do fato consumado, embora se tenha a ela reportado nos votos precedentes. O que, a meu sentir, é prevalente para o julgamento, é verificar se o tempo do estágio que está sendo questionado deve ser admitido ou não, para que se defina o atendimento ou não aos requisitos do edital. A Impetrante insiste na regularidade, contrapondo-se a isso a posição da Procuradoria-Geral de Justiça, que entende como não atendido o requisito do tempo de estágio.
A meu sentir, e com respeitosa vênia, entendo que esse requisito foi atendido satisfatoriamente e me reporto aos próprios termos da declaração daquele Juizado de Menores, onde estão dispostas todas as atividades do estágio, as quais foram acometidas e desempenhadas pela Impetrante ao tempo em que esteve desenvolvendo suas funções junto àquele juizado, salvo engano, na Comarca de Uberlândia.
Apenas para ilustrar, reporto-me a um artigo da lavra do Dr. Hugo César Amaral, advogado mineiro, publicado na Revista do TRF 1ª Região, v. 17, n. 6, junho/2005, comentando questões controvertidas acerca da exigibilidade da prática forense nos concursos jurídicos, e o articulista, dentre outros tópicos, faz uma análise pormenorizada, exatamente, dessa expressão, que destaquei aqui, do que seria a "prática forense", expressão, inclusive, que, antes, era comumente adotada nos editais de concurso, principalmente, na área jurídica e que através da Emenda 45/2004 foi substituída pela expressão "prática de atividade jurídica", que é como consta do edital do concurso em questão, objeto do presente mandado de segurança. O artigo acentua que se deve atentar para o fato de que a expressão "prática de atividade jurídica", inserida no edital do concurso, é bem mais abrangente - essas são considerações minhas extraídas do artigo, não são palavras textuais do articulista - e considerada por especialistas mais apropriada, até do que aquela outra que é usada em alguns editais "prática forense", abarcando não apenas as atividades desenvolvidas nos limites do foro, atividades forenses, como outras igualmente aptas a oferecer experiência jurídica.
É essa a observação que, a meu ver, dada a sua pertinência, encaixa-se à espécie presente, colhida do artigo do citado Professor Dr. Hugo César Amaral.

Parece-me que o ponto fulcral da questão está em se considerar que o tempo de pleno exercício desenvolvido pela Impetrante junto ao Juizado de Menores da comarca de Uberlândia, não foi infirmado nos autos, cujas atividades também não foram infirmadas ao longo da impetração, prestou-se ao desenvolvimento da sua habilitação técnica, desenvolvimento esse que se subsume, a meu sentir, com respeitosa vênia, na prática de uma atividade jurídica.
Portanto, com essas considerações e com redobrada vênia àqueles que têm entendimento em contrário, realçando-se, ainda, o fato, que serve apenas como suplemento, mas não fundamento da minha decisão, de que a Impetrante se houve com certo brilhantismo no concurso, logrou a aprovação em todas as suas etapas e, hoje, pelo que consta, já está em pleno exercício da honrosa e nobre função junto ao Ministério Público de Minas Gerais, acompanho o voto de V. Exª para conceder a segurança.
O SR. DES. BRANDÃO TEIXEIRA:
Sr. Presidente, pela ordem.
Gostaria de aditar à fundamentação de meu voto, que constou do Edital do Concurso, como se vê às fls 140/141, que se admite como comprovação de atividade jurídica o estágio profissional de advocacia, nos termos do art. 9º, II, da Lei 8.906/94, que é o Estatuto da Advocacia. Esse estágio é aquele que a lei exige para que o bacharelando cole grau. Então, no item VI do mesmo dispositivo do edital se fala de outros cargos, de empregos e funções que, a juízo da comissão, exige um conhecimento jurídico. Não está aqui consignado que se exige diploma de bacharel.
Por esta razão, assinalo que percebi que alguns dos votos proferidos impressionaram-se muito com a exigência do diploma de bacharel e, na verdade, nem isso o concurso exige.
Reafirmo a fundamentação de meu voto, agora enriquecida com a brilhante fundamentação do pronunciamento feito pelo Des. Armando Freire.
SÚMULA : CONCEDERAM A SEGURANÇA, VENCIDOS OS 3º, 4º E 6º VOGAIS.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
MANDADO DE SEGURANÇA Nº 1.0000.06.439921-5/000

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

A imprensa e os regimes democráticos


Quando algum movimento golpista ascende ao poder entre as suas providências iniciais está a de calar a imprensa.

No Brasil, à época da ditadura, convivemos por anos com uma voraz censura oficial, que coibia e reprimia, sem muito sucesso em alguns casos, a livre manifestação do pensamento, inviabilizando protestos ideológicos por parte dos meios de comunicação.

Porém, enquanto sejam mais visíveis os atentados à imprensa, em regimes autoritários, em estados “democráticos” também são perceptíveis ações intimidatórias à imprensa, especialmente quando os meios de comunicação começam a divulgar atos irregulares e corruptos dos detentores do poder.

Na Argentina, recentemente, assistimos à lamentável invasão da sede do Grupo Clarín, por fiscais federais, numa ação que o governo argentino reputou normal, mas que foi questionada por diversas entidades representativas do setor de comunicação. Na Venezuela de Hugo Chavez importante canal de TV foi fechado, sumariamente, pelo simples fato de se opor ao governo. Em Honduras, onde se vive um grave crise institucional e política, o governo de Micheletti já providenciou a completa destruição de um dos mais importantes canais de televisão, pelo fato de tomar partido a favor do presidente deposto Manuel Zelaya.

No Brasil, felizmente, a imprensa tem sido respeitada, lhe sendo assegurada a integral independência e autonomia para a realização de seu papel informador e estimulador de debates ideológicos. Lembremo-nos do ano de 2.005, quando da campanha massiva da imprensa sobre os envolvidos no Mensalão. Àquela época, mesmo atingindo o âmago do poder político central, os meios de imprensa não sofreram repressão oficial alguma. Tudo isto nos permite afirmar que as instituições democráticas, entre as quais há de se incluir a imprensa, estão a cada dia mais sólidas, em nosso país.

Resta-nos, por fim, lamentar decisões judiciais (liminares) que censuram previamente jornais de divulgarem notícias acerca de alguns fatos, como a de um juiz que proibiu o Estado de São Paulo de divulgar notícias acerca de uma investigação policial que analisava crimes em que o filho de um importante senador poderia estar envolvido. Não há espaço para este censura prévia, respaldada em decisão judicial, num regime que se diz democrático.

Necessário é que a imprensa seja sempre independente, para que a democracia se fortaleça, e para que o povo possa desenvolver cada vez mais seu espírito crítico.


Publicado no Jornal de Uberaba/MG, 04.10.2009.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

A frágil democracia latina


A redemocratização dos países da América do Sul é fato recente. Não faz tanto tempo assim que países como Chile, Brasil, Argentina e Peru viviam sob regimes políticos de exceção, onde a vontade do povo era sufocada por governos autoritários, normalmente de feição militar.

Pois superada a fase dos regimes ditatoriais parecia que a América do Sul, pobre economicamente, poderia modernizar-se, pelo menos em termos políticos. Neste contexto brasileiros, argentinos e outros povos voltaram a eleger diretamente seus governantes. A verdadeira democracia parecia instalada.

Pois, para a total decepção dos defensores da soberania popular, fatos recentes tem demonstrado que os regimes democráticos estão a perigo em diversas nações da América do Sul.

Embora os ataques à democracia hoje sejam menos violentos e explícitos que os dos golpes militares das décadas de 60, 70 e 80, não há dúvida de que em nações como Venezuela, Equador e Colômbia o regime político democrático gradativamente deixa de ser real e passa a ser puramente simbólico. A possibilidade de reiteradas eleições dos presidentes destes países viabiliza a criação de uma ditadura disfarçada, na qual os líderes populistas destas nações se veem em plenas condições de se perpetuarem indefinidamente no poder.

Hugo Chavez (Venezuela), Álvaro Uribe (Colômbia) e Rafael Correa (Equador) aparentemente bem captaram os ensinamentos do mestre da ciência política Nicolau Maquiavel, que ensinou os caminhos para a manutenção do poder político pelo governante.

O Brasil, que figura como nação mais poderosa do continente, seja em termos econômicos, seja em termos de importância política no cenário mundial, dá um exemplo, na medida em que o terceiro mandato de Lula, embora defendido por muitos, não se concretizará, e nosso governo federal poderá, em 2.010, ser substituído, possibilitando assim a saudável alternância do poder.

Aguardemos o desenrolar da história sulamericana, torcendo para que não retornemos aos negros anos dos regimes ditatoriais que, num passado não tão distante, tanto atraso e sofrimento trouxeram a nações vizinhas, e mesmo ao nosso país.


Publicado no "Jornal de Uberaba", de 17.09.2009.

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Marina Silva, a fiel da balança em 2.010


Com um discurso e uma ideologia de defesa da ética na política e de combate à corrupção o PT sempre arrebanhou para suas fileiras personalidades políticas de relevo. Durante muito tempo o adjetivo “petista” significou ser a pessoa combativa, crítica, inconformada com o sistema político.

Entretanto, desde que chegou ao ápice do poder político no Brasil, com a vitória do presidente Lula nas eleições presidenciais de 2002 o Partido dos Trabalhadores tem perdido, sistematicamente, valiosos membros. As decisões tomadas pelo centro de comando do partido (entenda-se presidente Lula) com vistas à manutenção do poder tem a muitos desagradado, sobretudo àqueles mais fiéis à ética e a moral políticas.

Tais divergências ideológicas propiciaram a saída, dentre outros, de nomes de peso como Heloísa Helena, Fernando Gabeira e Marina Silva. Seguramente todos os citados tem importância no cenário político brasileiro mas, a meu modesto ver, é a saída de Marina Silva a que poderá causar maior impacto político, sobretudo no pleito de 2.010.

Conquanto ainda não assuma publicamente, é certa a candidatura da ex-ministra do Meio Ambiente ao cargo de presidente da República em 2.010, pelo Partido Verde.

A fragilidade física de Marina Silva não é suficiente para esconder a força moral desta brava mulher. Marina é simples, verdadeira, honesta. Uma pessoa de princípios. Tudo indica ser uma candidata apta a ter uma campanha mais bem sucedida que a de Heloísa Helena em 2.006.

Obviamente Marina Silva não tem chances de vencer o pleito, pois tudo indica que a disputa ficará mesmo entre Serra (PSDB) e Dilma (PT), mas a relevância da candidatura de Marina está na possibilidade de tomar um grande contingente de eleitores da candidata do PT. Em uma eleição que se apresenta disputada, alguns milhões de votos que Marina possa tomar de Dilma podem determinar uma vitória de Serra.

Em 2.010 o PT pode pagar um alto preço por não valorizar devidamente uma de suas personalidades mais relevantes.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

Os atos secretos do Senado e a publicidade administrativa


A derrocada moral do Congresso Brasileiro, definitivamente, parece não ter limites.

Depois de sérias denúncias relativas à estrutura do Senado, o qual dispunha de incontáveis e desnecessárias diretorias criadas, ao que parece, para beneficiar pessoas ligadas à administração daquela Casa Legislativa, novamente o Senado volta, com o escândalo dos "atos secretos", a tomar conta de boa parte do noticiário.

O sigilo de atos administrativos é algo inadmissível e imperdoável num estado democrático de direito, onde a publicidade é erigida pela Constituição Federal ao patamar de princípio basilar da administração pública (CF/1988, art. 37, “caput”). Ao não publicar atos administrativos a direção do Senado Federal incorre em violação frontal não só ao princípio da publicidade, mas igualmente desatende ao princípio da moralidade administrativa, pois a omissão intencional quanto à publicação oficial visava a esconder a prática de atos que beneficiam interesses pessoais, por meio de nomeações de parentes, contratações irregulares etc.

O Ministério Público Federal, o Conselho de Ética do Senado e os próprios senadores devem tomar medidas enérgicas para se identificar os envolvidos, bem como punir-lhes exemplarmente, sob pena de o Senado Federal, hoje tão questionado enquanto instituição democrática, cair no mais absoluto descrédito diante da nação brasileira. Afinal, como tributar confiança a uma instituição que oculta deliberadamente suas ações, para beneficiar e atender a interesses escusos?

Ótimo exemplo, neste campo da publicidade administrativa, tem sido dado pela prefeitura municipal desta cidade, que tem veiculado em seu sítio eletrônico, na seção “Contas Públicas” grande volume de informações, relativas a compras, contratos, fornecedores, finanças dentre outras, relativas à atividade administrativa. Louvável tal providência eis que possibilita ao cidadão acompanhar o destino dos recursos públicos.

Se diz popularmente que o exemplo tem de vir de cima, porém, neste caso específico, o poderoso Senado Federal só teria a ganhar se adotasse práticas de publicidade administrativa como as implementadas em nossa cidade.
Publicado no jornal Correio de Uberlândia/MG, em 17.07.2009.

domingo, 21 de junho de 2009

Uma mentalidade retrógrada


Superando o descrédito e a desconfiança de muitos, o Presidente Lula está caminhando para o final de seu segundo mandato deixando um Brasil em bases econômicas sólidas e com sensíveis avanços na área social.

Conquanto seja indiscutível o sucesso de sua administração, fato que se reflete nos elevados índices de popularidade que o líder máximo da nação tem obtido em recentes pesquisas, não devemos deixar de lamentar e condenar o posicionamento do presidente acerca da proteção às nossas riquezas naturais.

Tem sido recorrentes em seus discursos as severas críticas, muitas delas permeadas por um tom irônico, às normas que versam sobre a proteção do meio-ambiente.

Lula tem criticado duramente as normas ambientais ao argumento, falacioso, de que elas constituem óbice ao desenvolvimento econômico do país. Para o presidente, é um absurdo a demora e o rigor no licenciamento ambiental, sobretudo de grande obras públicas. Se esquece o presidente de que o licenciamento ambiental somente é eficaz se precedido de um profundo e sério estudo do impacto da obra no meio-ambiente, o que demanda tempo..

Ao expor seu pensamento contra o rigor das normas ambientais Lula coloca-se em confronto direto com quem estiver respondendo pelo Ministério do Meio Ambiente. Foi assim com a combativa Marina Silva, que pediu demissão ao sentir não ter o devido apoio do presidente, e o mesmo hoje se verifica com o ministro Minc que igualmente encontra dificuldades para efetivar medidas de proteção ambiental. Ao que parece, na eterna disputa entre ruralistas e ambientalistas, o presidente tem dado mais ouvidos, e razão, àqueles.

O discurso de Lula é no mínimo retrógrado, e vai de encontro ao que se espera do presidente da nação conhecida mundialmente pelo seu vasto patrimônio ambiental e natural.

Lembremo-nos de que Al Gore, candidato derrotado por Bush nas eleições presidenciais americanas de 2.000, adquiriu notoriedade e respeito a nível mundial com o impactante filme-documentário “Um verdade inconveniente”, em que defende de forma ardorosa a proteção ao meio-ambiente e a defesa do desenvolvimento sustentável.

Se Lula deseja se tornar um verdadeiro líder mundial, que modernize seu discurso e suas ações, pois a degradação do ambiente já está provocando verdadeiras catástrofes naturais e devemos proteger o que nos resta de riquezas ambientais, e não compactuar com sua destruição.
Publicado no Jornal Correio de Uberlândia, de 27.06.2009.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Antecipando a campanha eleitoral

Quem circula pelas principais avenidas de Uberlândia deve ter se deparado com uma enorme quantidade de out-doors que estampam políticos de diferentes níveis de poder (do municipal ao federal), bem como de distintas correntes políticas (situação, oposição, centro).

Nestes imensos cartazes, os preclaros parlamentares divulgam suas ações em prol da coletividade, bem como os pontos principais de suas atuações parlamentares.

Deixando de lado a grande poluição visual que tais out-doors implicam o que, por si só, seria razão para se repudiar tal prática, a conduta dos parlamentares nos permite outras análises.

Inicialmente, revela-se desnecessária e inoportuna a divulgação de ações que, a meu modesto ver, são simples obrigações dos nobres vereadores e deputados estampados nestes cartazes.

Ora, enquanto representantes do povo, eleitos e custeados pelos cidadãos, o mínimo que se pode exigir destes nobres parlamentares seria que os mesmos procedessem a ações que trouxessem benefícios à coletividade. Isto é ínsito à ação parlamentar, e não acredito que alguém mereça elogios ou honrarias por simplesmente cumprir sua obrigação moral e legal.

Porém, numa análise um pouco mais cuidadosa, se percebe que o ano eleitoral de 2.010 se aproxima rapidamente, e um novo e complicado pleito eletoral se descortina aos adeptos do carreirismo político.

Esta publicidade abusiva de suas ações demonstra que muitos parlamentares já preparam o terreno para a ferrenha campanha eleitoral de 2.010.

Eleições parlamentares realizadas bienalmente geram a necessidade de os potenciais candidatos estarem sempre na mídia, para não caírem no esquecimento junto ao disputado eleitorado, o que viabiliza abusos e excessos de publicidade como os que se tem visto.

Por fim, deixamos aqui um questionamento: quanto cada um destes parlamentares gastou com referidas ações publicitárias? De onde vieram tais recursos?

terça-feira, 28 de abril de 2009

Os excessos do artigo 15, “caput” da nova Lei de Estágio

A Lei Federal nº 11.788, de 25 de setembro de 2.008 trouxe nova normatização para as relações jurídicas de estágio, revogando integralmente a legislação específica acerca do tema, notadamente a Lei Federal nº 6.494, de 07 de dezembro de 1.977.

A nova lei trouxe uma regulamentação moderna para os contratos de estágio, especificando as obrigações das partes envolvidas, bem como os diversos direitos dos estagiários (chamados na lei de “educandos”), sendo que muitos destes direitos não eram previstos na legislação anterior.

Neste breve artigo não desejamos esmiuçar a nova lei dos estágios, mais abordar especificamente um ponto da lei que, a nosso sentir, se for aplicado com todo o rigor da letra fria da lei, poderá gerar situação de reconhecimentos equivocados de relação de emprego em situações onde a relação é efetivamente um vínculo de estágio.

Falamos do artigo 15, “caput”, da Lei Federal nº 11.788/2008, que assim dispõe, verbis:

“Art. 15. A manutenção de estagiários em desconformidade com esta Lei caracteriza vínculo de emprego do educando com a parte concedente do estágio para todos os fins da legislação trabalhista e previdenciária.”

Verificamos, a princípio, que a legislação anterior nada dispunha, acerca do desvirtuamento do contrato de estágio, e sua transmudação em autêntica relação de emprego.

A jurisprudência, suprindo esta lacuna, veio a reconhecer que em diversas situações a parte concedente estava a aproveitar-se da baixa onerosidade do contrato de estágio para valer-se do labor de autênticos empregados (conforme art. 3º da CLT).

Certo é que deveras tênue se afigura a linha que separa a relação de estágio do vínculo laboral, tanto que em muitas situações presentes se encontram, nas duas modalidades contratuais, os elementos pessoalidade, onerosidade, não-eventualidade e subordinação, sendo que o desvirtuamento do vínculo de estágio é verificado pelo distanciamento entre os propósitos do estágio e a realidade do educando quando da prestação de serviços.

Melhor explicando, para a jurisprudência há a descaracterização do estágio quando os serviços executados não proporcionam ao educando a apropriada complementação do ensino e da aprendizagem ou, nos dizeres do artigo 1º, parágrafo 2º da lei 11.788/2008, quando não oferecem o “aprendizado de competências próprias da atividade profissional e à contextualização curricular, objetivando o desenvolvimento do educando para a vida cidadã e para o trabalho.”

O tratamento que os tribunais tem dado ao tema, a nosso ver, está apropriado, não merecendo correções.

Ocorre que, com a entrada em vigor da nova lei de estágios, pode ocorrer de ser descaracterizada a relação de estágio, ainda que a parte concedente esteja de boa-fé, e proporcionando ao educando a devida complementação de aprendizagem.

O artigo 15, “caput”, acima citado encerra um rigor deveras exacerbado, e pode proporcionar insegurança jurídica entre as entidades públicas ou privadas e mesmo entre os profissionais liberais que ofereçam estágio.

Com efeito, a norma citada determinou que toda e qualquer desconformidade da manutenção de estagiários com os preceitos da lei 11.788/2008 gera o inarredável efeito da caracterização do vínculo de emprego do educando com a parte concedente.

A nosso ver, tal rigor da lei presta um absoluto desserviço às relações educandos x partes concedentes, eis que obrigações há que, embora descumpridas, não tem o condão de desvirtuar a natureza do contrato de estágio, convertendo-o em contrato de emprego autêntico.

Pensemos sobre algumas situações práticas.

Figuremos o caso de um educando submetido a um estágio não-obrigatório, que presta seus serviços perante um escritório de advocacia, percebendo bolsa, mas não lhe sendo concedido o auxílio-transporte. Imaginemos que tal vínculo perdure por dois anos (limite máximo autorizado pela lei).

No caso sobrecitado, por não ter sido oferecido o auxílio-transporte, embora devido, se aplicarmos o rigor do artigo 15, “caput” da lei de estágio o vínculo haveria de ser concebido como autêntica relação de emprego, desde o seu princípio. Tal rigor extrapola os limites do razoável, sobretudo face à grande onerosidade que tal norma irá impor ao concedente do estágio. No caso apresentado, pela aplicação do art. 15, “caput”, seriam devidas verbas diversas por parte do concedente, tais como férias, décimos terceiros, aviso prévio etc quando, efetivamente, ele apenas deixara de pagar um benefício, qual seja o auxílio transporte (art. 13, “caput”).

Vislumbremos uma outra situação, para verificarmos o quão uma interpretação puramente literal do “caput” do artigo 15 pode ser gravosa e severa.

Suponhamos que uma empresa tenha 100 empregados. Pela aplicação do artigo 17, IV, esta empresa, enquanto parte concedente, poderá ter no máximo 20 estagiários (educandos). Mas, o que ocorreria se esta empresa mantivesse 21 estagiários, ou seja, um a mais que o máximo permitido pela lei.

Todos os contratos de estágio seriam automaticamente convertidos em vínculos empregatícios, face à manutenção de estagiários em desacordo com a lei?

Esta não parece ser uma solução que atenda ao bom-senso e à razoabilidade.

Citamos apenas duas situações, mas poderíamos mencionar diversos outros casos, em que se poderia aferir os excessos da lei.

O que desejamos deixar claro, neste singelo e breve estudo, é que o “caput” do artigo 15 encerra regra deveras rigorosa, passível de gerar situações de injustiça e de excessiva onerosidade a partes concedentes que venham a descumprir alguma exigência legal, ainda que de pequena monta.

Entendemos que o desvirtuamento da relação de estágio pode sim ocorrer, sob diversas formas, entretanto, a caracterização do mesmo deve sempre ser apurada a partir do distanciamento da prestação dos serviços, pelo educando, dos propósitos da relação de estágio. Em outras palavras, quanto mais distante estiver o estágio de sua função precípua que é assegurar o “aprendizado de competências próprias da atividade profissional e à contextualização curricular, objetivando o desenvolvimento do educando para a vida cidadã e para o trabalho” (Lei nº 11.788/2008, art. 1º, § 2º), mais próximos estaremos de uma autêntica relação de emprego.

Observa-se, pois, que a norma do artigo 15 é inspirada por um rigor que, a nosso modesto ver, transcende a razoabilidade e proporcionalidade, podendo, sob o falso argumento de proteger o estagiário, gerar insegurança jurídica para a parte concedente, ainda que esta esteja agindo de absoluta boa-fé. A nosso sentir, bastaria a regra do artigo 3º, § 2º, para que o contrato de estágio restasse protegido quanto a eventual desvirtuamento, sendo desnecessária a regra do artigo 15, “caput”.

Caberá à jurisprudência e à boa doutrina delimitar a aplicação da referida norma, balizando seu rigor, proporcionando o atingimento de seu objetivo mor, que é proteger os educandos.
Publicado no Jornal do 49º Congresso Brasileiro de Direito do Trabalho, evento realizado em São Paulo/SP em junho de 2.009.

terça-feira, 7 de abril de 2009

Protógenes, herói ou vilão?

Há um ano atrás o delegado federal Protógenes Queiroz não passava de um ilustre desconhecido. Era apenas mais um delegado a despender seus valorosos esforços na investigação dos normalmente complexos delitos federais. Bastou a conclusão do inquérito policial por ele presidido e que culminou na mega-Operação Satiagraha e na prisão do poderoso banqueiro Daniel Dantas (posteriormente solto em virtude de decisão do STF) para que o delegado ascendesse ao estrelato na mídia política e policial, e figurasse como o pivô de um debate que confronta instituições e procedimentos.

Daniel Dantas ficou preso pouco tempo, mas a atuação do delegado federal citado até hoje repercute, sobretudo face aos métodos adotados, para se concluir de forma exitosa a investigação policial. A suspeita do “grampo” do telefone do presidente do STF Gilmar Mendes foi a gota d´água para levantar-se o debate sobre os limites e a legitimidade, de suas ações investigativas. Não foi provada a participação do delegado, bem como o suposto auxílio da ABIN, no caso do grampo do telefone do ministro e presidente da mais alta Corte do país, mas é certo que o mesmo ocorreu e serviu para o delegado ganhar um poderoso inimigo, chamado Gilmar Mendes.

Há suspeitas de excessos e abusos, na condução do inquérito, relativas sobretudo à utilização ilegal de escutas telefônicas, entretanto, ao que parece nada foi ainda concretamente provado.

Conquanto pairem tais dúvidas sobre a legalidade da investigação não há como não elogiar o espírito destemido e combativo do Dr. Protógenes que enfrentou de frente Daniel Dantas, um influente banqueiro, suspeito de ações financeiras ilegais, colocando-o atrás das grades duas vezes. A prisão do banqueiro, por alguns instantes nos fez acreditar que a impunidade imoral dos poderosos poderia dar lugar à realização da justiça.

Provavelmente a verdade não virá à tona, e não saberemos se Protógenes foi um ardoroso e honesto combatente da corrupção, ou se foi apenas um egocêntrico policial que queria notabilizar-se por ter colocado atrás das grades um controvertido personagem do sistema financeiro, utilizando de métodos ilegais para tanto.

De qualquer forma, imagino que seu destino já esteja escrito. Tudo indica que será processado disciplinarmente, no âmbito da Polícia Federal, e será demitido. Para os que creem nos seus excessos e abusos, ter-se-á feito a justiça. Para os que acreditam na sua honestidade, ter-se-á feito um mártir.


Publicado no Jornal Correio de Uberlândia, edição de 13.04.2009.

sábado, 14 de março de 2009

Milícias rurais


Pode parecer paradoxal mas o Brasil, que figura como uma das nações que mais possui terras agricultáveis, é ao mesmo tempo o palco de históricos, persistentes e cada vez mais violentos conflitos pela posse da terra.

Recentemente, dois episódios demonstraram o alto grau de periculosidade que estão assumindo os grupos que, defendendo a bandeira da reforma agrária, teimam em disseminar a violência e a desordem, em suas ações.

Em Pernambuco, quatro seguranças de uma fazenda foram assassinados, num episódio de suposta legítima defesa, mas que aparentemente mais se aproxima de uma execução brutal e sumária.

Na semana passada, numa ação estrategicamente coordenada, diversas mulheres pertencentes a um grupo de luta pela terra realizaram diversas ações, todas repudiáveis, pelos danos que deliberadamente perpetraram, num propósito único de chamar a atenção da grande mídia nacional.

Enquanto estado democrático de direito, que assegura a liberdade de expressão, e manifestação, não há dúvida de que o protesto é legítimo, de modo a que todo cidadão que se julgar prejudicado, quanto à distribuição da propriedade rural neste país, pode defender a bandeira da reforma agrária.

O que é de todo repudiável, são as ações cada vez mais orquestradas e destrutivas, as quais tem resultado em danos patrimoniais (laboratórios de pesquisa de transgênicos são alvos preferenciais dos militantes), em mortes, e em insegurança social. O pontal do Paranapanema, em SP, é centro de constantes e numerosas invasões.

Não há dúvida de que a reforma agrária há de ser ampliada, de modo a que os inúmeros latifúndios, muitos deles improdutivos, sejam devidamente repartidos entre pessoas que desejam trabalhar a terra, e dela tirar seu sustento. A razão das ações dos grupos de luta pela terra é legítima, e quanto a isto não se discute, mas a forma como tem planejado e executado tais ações não tem lugar, num estado de direito.

Mas é fato que uma reforma agrária somente será bem sucedida se for baseada em um sério projeto governamental, com adequado planejamento, e com o dispêndio dos necessários recursos.

Enquanto o governo federal se omitir, não assistiremos à democratização da posse da terra, mas sim ao recrudescimento da violência, e ao fortalecimento destas verdadeiras milícias rurais.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Criminalização dos trotes


No dia 18.02.2009 assistia, no final da tarde, aos debates travados na Câmara dos Deputados, acerca da criminalização dos trotes violentos realizados no âmbito das universidades e faculdades como forma de “recepcionar” os ingressantes.

As propostas em debate na Câmara, basicamente, incriminam o trote, inovando na ordem jurídica pátria, mediante a criação de uma nova figura penal.
Pessoalmente, não vejo razão nas medidas que incriminam os trotes, e assim penso por dois motivos.

Primeiro, todos os atos que compõe o evento trote já são crimes, podendo ser perfeitamente enquadrados como lesão corporal, injúria real e em alguns casos, podem resultar até em homicídios (lembremo-nos do estudante de Medicina da USP, morto afogado, durante um trote).

Segundo, porque, à exceção dos casos mais graves, em que do trote resulte lesão corporal grave, ou mesmo um homicídio, nos demais o tratamento penal é simplesmente benevolente, resumindo-se as punições a medidas que pouco ou nada intimidam os universitários afetos às práticas do trote.

A meu ver, as medidas disciplinares administrativas seriam meios jurídicos mais idôneos e efetivos a coibir-se a prática dos trotes violentos. Seguramente, a notícia de que um colega foi suspenso por um semestre ou foi expulso e perdeu sua vaga na universidade por ter praticado trotes com violência teria ótimo efeito pedagógico perante seus pares.

O universitário infrator não se intimidaria ao saber que ao praticar uma lesão leve teria uma penalidade branda. Mas seguramente pensaria duas vezes antes de praticar um trote violento, se imaginasse que sua vaga na universidade estaria em risco.

O que precisamos, para coibir o trote, é de maior conscientização, de modo que os veteranos saibam que violência não combina com o ambiente universitário, lugar destinado à liberdade intelectual e à criatividade, e não à violência física e agressividade.

Entretanto, como todas as regras têm exceções, e como o comportamento humano é sempre imprevisível, para aqueles que insistirem em transformar os trotes estes espetáculos de violência a que temos acompanhado, que as administrações universitárias instaurem os competentes procedimentos disciplinares, punindo exemplarmente aqueles que disseminarem a violência.

O que não se pode é noticiar, ano após ano, os trotes violentos, e sempre se perceber que ninguém resta punido de forma exemplar.

Publicado na edição do Jornal Correio, de 26.02.2009, edição n.21.503, ano 70, Uberlândia/Mg.

sábado, 7 de fevereiro de 2009

Homenagem discutível


Um dos grandes orgulhos dos munícipes de Uberlândia é o belo estádio de que nossa cidade é provida. Com sua grandiosidade e beleza inigualáveis, o estádio do Parque do Sabiá, oficialmente denominado João Havelange, é mais uma demonstração do que são capazes os uberlandenses. Só não posso entender nem concordar com a homenagem feita ao ex-presidente da Fifa João Havelange, quando em nossa cidade, seguramente, diversas pessoas seriam pelo seu trabalho, em prol do Município, dignas de serem eternizadas cedendo seu nome àquele estádio municipal. Nada contra a pessoa do sr. João Havelange sobre o qual, confesso, pouco ou nada sei, mas a questão é que em Uberlândia muitas outras personalidades seriam merecedoras de tal privilégio. Sem grande esforço, posso mencionar os ex-prefeitos Virgílio Galassi e Renato de Freitas que batalharam por nossa cidade e que mereceriam dar nome ao nosso majestoso estádio do Parque do Sabiá. Uberlândia sempre progrediu com o trabalho de seu povo. Que se lembrem destas pessoas quando da concessão de alguma homenagem!

Publicado no Jornal "Correio", de Uberlândia/MG, edição nº 21.484, em 07.02.2009.

sábado, 31 de janeiro de 2009

Interpretando Obama


Desde que assistimos à vitória de Barack Obama nas eleições presidenciais americanas uma onda de otimismo tem percorrido diversas nações.

Depois de oito anos de uma administração desastrosa do Presidente Bush, onde o mundo ficou mais inseguro e a econômica americana restou à beira da ruína, parece que a ascensão do jovem e mestiço Barack Obama ao posto de homem mais poderoso do planeta serve de alento a todos que almejam um futuro mais pacífico.

Pessoalmente não acredito que uma única pessoa, por mais poderes que tenha em mãos, e por mais bem-intencionada que esteja, possa resolver todos os profundos e complexos problemas que tolhem à civilização atual.

Entretanto, estas reservas quanto ao que se pode esperar de Obama, não afastam um otimismo realista e sensato, acerca dos resultados a se esperar de sua administração à frente da nação mais poderosa do globo.

Inicialmente, vejo como bem ilustrativa das ações a se esperar de Obama no campo dos direitos humanos, a sua decisão de suspender os julgamentos dos presos de Guantánamo, bem como de fechar aquele campo de concentração moderno, no prazo de um ano.

Obama, ao assim decidir, demonstrou possuir uma visão dos direitos humanos que passou longe da Casa Branca, durante a administração de seu antecessor. Isto tem acentuado simbolismo, pois pode acenar para uma administração que tenda a respeitar as pessoas, independentemente da nação ou religião à qual pertençam, simplesmente pelo fato de serem humanos. A bandeira dos direitos humanos sendo concretamente defendida por uma autoridade tão influente, quanto Obama, somente pode trazer progressos neste campo.

Lado outro, ao abrir a possibilidade de dialogar com o mundo islâmico, Obama evidenciou que procurará um caminho não belicoso para a solução de divergências históricas entre os interesses e ideologias defendidos por americanos e mulçumanos.

O modelo de tomada de decisões unilaterais, defendido por Bush, revelou-se desastroso e nada eficiente, pois a situação política de Iraque e Afeganistão segue ainda deveras conturbada. Ao acenar para soluções negociadas de divergências Obama sinaliza que podemos esperar que nos próximos quatro anos os EUA não perpetrarão operações militares catastróficas e destrutivas, como a invasão do Iraque.

O novo presidente americano está ainda “tomando pé” dos problemas que haverá de enfrentar, mas suas decisões já tomadas servem de fomento a este otimismo que tomou conta do planeta.

Não vejo em Obama um novo messias, enviado para dar a humanidade a tão sonhada redenção, mas sim um governante prudente e bem-intencionado que, apesar de sua juventude, demonstra maturidade suficiente para perceber que um mundo melhor pode ser construído, com menos guerras, e com mais diálogo, consensos e tolerância.

Afinal, por mais que os americanos resistam em admitir, eles estão inseridos nesta grande aldeia global, e devem interagir de modo inteligente, com as demais nações.
Publicado no Jornal "Correio" de Uberlândia/MG, edição nº 21.482, de 05.02.2009.

domingo, 18 de janeiro de 2009

A sucessão em Minas


Inquestionavelmente o governador Aécio Neves tem feito uma administração séria e competente à frente do governo de Minas Gerais. Pautada em princípios de uma administração gerencial, calcada na responsabilidade fiscal, na contenção dos gastos e na otimização da máquina administrativa, nosso atual governador deixará, para o futuro líder dos mineiros, um Estado em condições bem melhores, que as recebidas, em janeiro de 2003.

Mas, a qual liderança política os mineiros passarão, pelas urnas, o direito de governar esta unidade federativa tão relevante, histórica e economicamente, chamada Minas Gerais?

Não há dúvidas de que o vice-governador Antônio Augusto Anastasia, um dos mentores do choque de gestão, que viabilizou o retorno de Minas aos trilhos do progresso, é nome cotado ao posto de futuro governador. Resta saber se o nosso vice-governador tem o carisma e o dom para a política, que possam tornar sua candidatura viável. Isto somente os articuladores dos partidos da situação poderão aferir, à custa de muito esforço, eis que competência técnica, nem sempre quer dizer viabilidade eleitoral.

Outrossim, dada a aproximação entre o governador Aécio e o ex-prefeito de BH, o petista Fernando Pimentel, poder-se-ia conceber a possibilidade desta nova liderança petista, ascender ao Palácio da Liberdade, com o apoio do governador. Se Aécio e Pimentel já firmaram parcerias importantes, em prol da capital, inclusive apoiando um mesmo candidato à prefeitura de BH, não é de todo impossível que um novo pacto levante a candidatura do petista, ao governo mineiro.

Com a devida vênia, não creio muito na efetivação das candidaturas acima citadas e, apreciando o cenário político mineiro atual, citaria Odelmo Leão, como um nome possível, e viável, para assumir o governo mineiro.

Quem analisa a carreira política de Odelmo, verifica que desde sua primeira eleição à Câmara dos Deputados, o atual alcaide dos uberlandenses vem tendo uma verdadeira ascensão política, sempre bem sucedida e vitoriosa. O atual prefeito da segunda maior cidade mineira transita tranquilamente entre diversas alas do poder, seja da esquerda, seja da direita.

Dada sua carreira estritamente parlamentar a qual perdurou até 2002, há alguns anos atrás poder-se-ia questionar seu talento administrativo mas a reeleição, em primeiro turno, em uma cidade de eleitorado crítico e de administração complexa, como Uberlândia, não deixa dúvidas quanto à aquisição de uma competência administrativa que o credencia ao governo dos mineiros.

Milita em favor desta tese a proximidade e relação de respeito mútuo, entre o governador Aécio, e o prefeito Odelmo, tendo aquele, inclusive, convidado este a administrar a importante secretaria estadual de agricultura, logo que assumiu o governo de Minas.

Tudo isto são, neste momento, meras hipóteses, a serem confirmadas, ou não. Resta-nos aguardar o desenrolar das articulações, lembrando que 2010 está mais próximo do que se imagina.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

A PEC dos vereadores


A composição das Câmaras de Vereadores dos municípios brasileiros pode sofrer acentuada alteração, em seus quantitativos, na eventualidade de a PEC 020/2008 (Projeto de Emenda à Constituição), de autoria do Deputado Federal Pompeu de Mattos e já aprovada no Congresso, vir a ter o aval do Supremo Tribunal Federal.

Aparentemente, a tentativa de se criar tamanha quantidade de vagas, através de uma inoportuna emenda constitucional, visa a “dar uma resposta“ ao TSE que, em 2004, com a edição da Resolução nº 21.702/2004, promoveu a extinção de milhares de cargos de vereador, em diversas cidades brasileiras.

Observamos, na justificativa que encaminhou o citado projeto de emenda à Constituição Federal, que o mesmo visava, a princípio, estabelecer nada menos que 25 faixas de quantidade de vereadores, segundo a população de cada municipalidade, fixando um critério mais objetivo que o atualmente em vigor (art. 29-A da CF/88). Uma vez aprovada, esta emenda teria como conseqüência imediata a criação de aproximadamente oito mil novos cargos de vereador. Somente nossa cidade de Uberlândia seria “contemplada” com mais seis cargos, os quais se somariam aos 21 já existentes.

Os defensores da citada PEC argumentam que um número maior de vereadores possibilitaria maior capacidade representativa às Câmaras Municipais, em outras palavras, seria como se o povo, que é o efetivo detentor do Poder (CF/88, art.1º, parágrafo único) tivesse maiores possibilidades de se fazer ouvir pelos edis, viabilizando o atendimento de anseios comuns.

A aprovação da PEC evidencia o quão distantes e desconectados com as necessidades do povo estão nossos congressistas. Enquanto em todo o mundo se debatem mecanismos para se combater a crise financeira global, nossos deputados e senadores estão a defender interesses meramente corporativos e partidários e que gerarão mais dispêndios de nossos já escassos recursos públicos.

Outrossim, caso de fato haja uma “deficiência de representativade”, em decorrência dos atuais quantitativos de vereadores, que se submetam os mesmos a uma rotina de labor mais intensa, reduzindo-se os recessos legislativos.

Uma melhor representatividade não há de ser obtida aumentando-se o número de vereadores. O que se espera, antes, é um maior envolvimento destes com os problemas do povo e da cidade, bem como sejam debatidos assuntos de verdadeira relevância para os munícipes.

O Poder Legislativo é um dos pilares de existência e manutenção de um Estado Democrático de Direito, devendo ser-lhe assegurada uma estrutura sólida e independente, entretanto, aumentar os gastos com o mesmo, através de uma descabida, desnecessária e inoportuna criação de milhares de cargos de vereador, afronta o bom senso, e colide com a opinião pública razoavelmente instruída.

Nosso Congresso Nacional, uma vez mais decepcionando o povo, aprovou a PEC 020/2008, restando-nos a esperança de que o STF não avalize projeto tão despropositado.