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terça-feira, 2 de setembro de 2008

Liberdades em risco


Superado o negro período de exceção política, a que foi submetido o Brasil entre 1964 e 1985, o país conseguiu, a duras penas, a promulgação de uma carta política a qual, apesar de criticável sob o ponto de vista de sua técnica e estrutura, é deveras elogiável, quanto ao conteúdo.

E o conteúdo louvável deve-se justamente à presença de inúmeras normas que asseguram direitos e garantias fundamentais, os quais foram sistematicamente desrespeitados, sobretudo em face de ações policiais, à época da ditadura militar.

As liberdades individuais foram concebidas filosoficamente, na França pré-revolucionária, enquanto limitações à atividade de um estado opressor, e ostentam este status jurídico até os dias atuais. As liberdades individuais não definem o que os cidadãos podem fazer, mas estabelecem o que o estado não deve fazer, em face daqueles.

Pois não obstante o espírito protetivo da Constituição Federal de 1.988, temos assistido a situações que, além de configurar frontal descumprimento dos preceitos constitucionais fundamentais, colocam em dúvida se, de fato, vivemos em um autêntico Estado Democrático de Direito.

A tão badalada operação Satiagraha, levada a efeito pela Polícia Federal, demonstrou o quão distantes estão nossas autoridades policiais da correta interpretação dos princípios constitucionais básicos. O direito à liberdade, que segundo nossa Constituição Federal somente pode ser tolhido em situações extremas, ao que parece, não é digno de valor algum tanto que, sem uma razão plausível, quase uma dezena de pessoas foi presa, num espetáculo televisivo deveras deplorável.

Mas, mesmo antes da desastrosa operação, a autoridade policial condutora do inquérito que resultou na mesma já havia pedido a prisão de jornalista da Folha de São Paulo, pelo simples fato de divulgar informações que davam conta de ser Daniel Dantas um dos investigados, numa verdadeira ofensa à liberdade de imprensa. Será que o art. 5º, XIV da CF/88 foi revogado, e não nos informaram?

Pois, para coroar este circo de desrespeitos aos direitos fundamentais básicos, tivemos a intimidade da maior autoridade do Poder Judiciário Pátrio violada e, o que é pior, por outra entidade estatal.

Os “grampos” que flagraram conversas do Ministro Gilmar Mendes nos fazem lembrar da KGB soviética, ou da Gestapo nazista que, atropelando lídimos direitos individuais, devassam a vida de todos, à procura de inimigos do Estado. Será o Ministro Gilmar Mendes um inimigo do Estado?

Milhares de ligações telefônicas sendo interceptadas, com autorização judicial, já é um fato por si só deplorável, mas quando se divulga que o próprio Judiciário começa a ser clandestinamente investigado por um órgão do Executivo, uma luz vermelha há de se acender, indicando que a propalada democracia e a separação e independência de poderes, são muito mais frágeis do que imaginamos.

Setores do aparato estatal não têm demonstrado o devido respeito às liberdades individuais. Não querendo ser alarmista, há razões para nos preocuparmos com esta escalada da opressão.


Publicado na edição do Jornal Correio, de 07.09.2008, edição n.21.331, ano 70, Uberlândia/Mg.

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