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quarta-feira, 23 de maio de 2012

Progresso questionável

Sou otimista e vejo que na última década o Brasil obteve uma moderada estabilidade econômica a qual proporcionou um crescimento econômico ora tímido, ora até razoável, mas pelo menos não fomos intensamente atingidos pelas crises americana de 2008 e pela europeia de 2011/12. Entretanto, observando com maior acuidade nossa economia, verificamos o quanto ainda somos frágeis, e quão grande é o caminho a se percorrer e os desafios a superar.

Nossa indústria hoje contribui com menos de 15% do nosso PIB, o que demonstra sua fragilidade e que nosso país segue sendo agrário e extrativista. As grandes economias asiáticas só atingiram um crescimento econômico sustentável quando se industrializaram.

Em menos de quatro meses o valor do dólar variou mais de 20%, o que evidencia que ficamos ao jugo do que ocorre lá fora, e que temos poucos instrumentos para controlar o valor de nossa moeda frente à moeda americana.

Nosso PIB, outrora pujante, patina em índices cada vez mais baixos, o que sinaliza um desaquecimento econômico, senão uma recessão a médio prazo.

E tudo isso num cenário de tributação extorsiva, que oprime a indústria e o setor de serviços, e de um estado burocrático, pesado e ineficiente.

Que Dilma, com sua visão técnica, abra os olhos a estes problemas e a muitos outros que atravancam nosso progresso, e coloque este país na trilha no crescimento real, e não meramente ilusório, como este a que temos assistido nos últimos anos.

Publicado no Jornal Correio de Uberlândia, de 27.05.2012.

terça-feira, 22 de maio de 2012

Dilma, os bancos e os juros

A presidente Dilma não tem ingerência direta sobre os bancos privados, mas estão sob o seu poder os dois principais brancos brasileiros: o Banco do Brasil e a Caixa. Dilma não pode impor aos bancos privados a redução em suas extorsivas taxas de juros, mas pode determinar que os bancos públicos acima citados reduzam drasticamente os juros praticados com vistas a que, pelas leis da concorrência, os demais bancos, que há anos contabilizam lucros fantásticos, se deparassem com a necessidade imperiosa de reduzir seus juros, sob pena de perder clientes e espaço no mercado de crédito. Dilma vem tendo a virtude de “comprar brigas” que seus antecessores se furtaram a enfrentar, e esta postura com os bancos é uma delas. Os poderosos bancos privados brasileiros sempre lucraram em com a omissão dos presidentes anteriores, que eram coniventes com as práticas abusivas, sobretudo na estipulação dos juros aplicáveis. Ao assim proceder, a presidente age dentro da legalidade e segundo as normas do mercado, não restando aos bancos privados outra saída que não a de baixar seus juros outrora irreais. Palmas para a presidente.

Publicado com o título "Palmas para a presidente" no Correio de Uberlândia, em 22.05.2012.

Comentário de um leitor, enviado por e-mail: "Prezado Hugo, Sou seu colega advogado e leitor do jornal correio, sempre acompanho suas críticas e sugestões, venho através deste parabenizar pelas colocações feitas no jornal, pois são sempre colocadas de maneira imparcial e inteligente, tanto no âmbito político, social e jurídico. Continue expondo suas ideias, pois o leitor merece ler matérias e comentários de qualidade."

terça-feira, 8 de maio de 2012

O STF e a nossa vida

Cada vez mais os noticiários televisivos e virtuais têm se ocupado de apresentar e discutir as atividades do Supremo Tribunal Federal brasileiro. Questões de imensurável relevância têm sido debatidas e julgadas no órgão máximo da Justiça brasileira e isto tem chamado a atenção de todos, pois de certa forma as decisões do Supremo direta ou indiretamente atingem a vida de qualquer brasileiro.

Temas como uso de células-tronco em pesquisas, união civil de pessoas de mesmo sexo, aborto de anencéfalos permeiam a sociedade brasileira, assim como a de qualquer sociedade civilizada e, por atribuição constitucional, ao STF tem cabido dar a última palavra nestes e em muitos outros debates polêmicos, e próximos a nós todos.

A título de exemplo da proximidade das consequências práticas das decisões do Supremo, temos que recentemente deliberou aquele tribunal que os crimes previstos na “Lei Maria da Penha” não mais dependem de representação da mulher vítima do crime para serem processados, ou seja, um vizinho pode chamar a polícia ou fazer uma denúncia e comprovado o delito, o autor restará processado.

Ainda exemplificando, temos que as cotas raciais e sociais para ingresso em entidades de ensino foram, há duas semanas, declaradas constitucionais, pacificando uma questão, pelo menos do ponto de vista jurídico-legal, que há anos se arrastava.

Dada a relevância constitucional do STF e dada a relevância das decisões do Supremo na vida de cada um de nós, seria oportuno que aquela Corte Judicial representasse com maior precisão e legitimidade a sociedade brasileira, que é em última instância a principal destinatária de suas decisões. Pela lógica puramente estatística da população brasileira, a composição do Supremo deveria contemplar seis mulheres e ao menos quatro negros, para que se pudesse dizer que a sociedade brasileira, que será a destinatária das decisões emanadas daquela Corte, pudesse estar adequadamente representada. Apreciando a composição do STF sob este enfoque veremos que hoje aquele tribunal, definitivamente, ainda não tem cara de Brasil.

FHC, com a nomeação da primeira mulher, e Lula, com a nomeação do primeiro negro, deram os primeiros passos no sentido de fazer do Supremo um retrato mais fiel da nação brasileira, porém, a evolução tem sido lenta e tímida neste aspecto.

Lado outro, deveria haver critérios mais democráticos e objetivos de escolha dos futuros ministros daquela Corte de Justiça, talvez se permitindo o acesso ao Supremo até através de voto popular. O mecanismo de acesso ao STF hoje em vigor é centralizado e confere ao presidente da República grande poder e influência sobre aquela instituição. Lula, por exemplo, nomeou oito ministros para o Supremo, sendo destes seis ainda em atividade. Teve o ex-presidente, portanto, oportunidade de conferir àquele tribunal (que tem onze membros) o perfil que desejou, posto que as escolhas dos futuros ministros podem, inquestionavelmente, serem pautadas por características destes que venham a favorecer os interesses do chefe do Executivo. 

O STF tem, pela Constituição Federal de 1.988, a competência para deliberar sobre assuntos diversos inerentes à nossa vida privada. Me paira a dúvida, entretanto, se o mesmo tem a devida legitimidade para tanto!

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Uma "cachoeira" de corrupção

As relações promíscuas entre empresários, políticos e administradores não são fatos incomuns no âmbito da administração pública brasileira dado que a corrupção imiscuiu-se em nosso país em todos os poderes e em todos os níveis de governança, do municipal ao federal e os casos clamorosos de corrupção não provocam estarrecimento algum nos brasileiros, no máximo uma decepção.

O escândalo do momento diz respeito às ações do contraventor, a quem alguns denominam vulgarmente de “bicheiro” Carlos Cachoeira.

O escândalo veio à tona inicialmente com a demonstração do envolvimento de um proeminente senador oposicionista com o “bicheiro’, onde foram levantadas suspeitas de que o parlamentar estava a defender interesses diretos do contraventor no âmbito do Legislativo Federal, interesses estes ligados à polêmica da legalidade dos jogos de azar no Brasil. Esta relação obscura do “bicheiro” com o parlamentar corresponderia a uma corrupção sofisticada, cujo objeto seria não contratos administrativos superfaturados, ou desvio de recursos públicos, mas sim a defesa, por um congressista, dos interesses espúrios de um contraventor. 

Ocorre que as investigações da Polícia Federal, à medida em que deixam vir à tona o que tem sido apurado, evidenciam um complexo, grandioso e organizadíssimo sistema de corrupção em que podem estar envolvidos até mesmo governadores de distintas cores partidárias.

A CPI recentemente instalada, se tiver seus trabalhos desenvolvidos com independência, poderá fazer história no combate à corrupção no Brasil, seja pela enorme quantidade de corruptos que poderão ser limados da administração pública, seja pelo conhecimento que se poderá ter das ações e métodos utilizados por uma verdadeira organização criminosa no âmbito da administração pública, o que apenas demonstra o quão falhos e frágeis são os sistemas de fiscalização da atividade administrativa em nosso país, os quais têm se mostrado inábeis a prevenir os danos ao erário.

Posicionando-se frente ao escândalo a presidenta Dilma já anunciou que membro de seu governo que for flagrado em escuta telefônica será sumariamente demitido. Lado outro, não é nada confortável a situação de dois importantes governadores possivelmente envolvidos com o contraventor. Ou comprovam sua isenção frente às suspeitas, ou o impeachment passa a ser uma possibilidade.

Embora o autor destas linhas sempre veja com ceticismo a instauração de CPIs a denominada “CPI do Cachoeira” tem uma particularidade de investigar políticos de diversos partidos, da situação e da oposição. Cada lado da contenda vai querer ver um político do outro lado sendo exposto e desmascarado perante a nação e, neste embate autofágico, pode não sobrar pedra sobre pedra e o esquema ser relevado em sua integralidade.

O ex-presidente Lula viu na CPI a possibilidade de ver a oposição enfraquecida para as eleições municipais que se aproximam. Particularmente, acredito que a própria situação possa ter lá seus inconvenientes eleitorais, conforme os rumos que as investigações tomarem!

Espera-se que a CPI mista instalada no âmbito do Congresso Nacional faça história na política brasileira e demonstre que mesmo esquemas complexos de corrupção podem ser desarticulados, quando há vontade política.


Publicado no Jornal da Manhã, de Uberaba, de 03.05.2012.